terça-feira, 28 de setembro de 2010

Será que ouvias Elis Regina na estação?


De manhã, bem cedinho, vi você na estação do metrô, você fumava, deu-me vontade de ir falar com você, dizer-lhe dos males da nicotina, como sempre fazia. Vi você e estavas com os cabelos encarolados e despenteados, como sempre; sorri, porque adorava vê-lo de manhã tentando penteá-los. Você estava com aquela camisa pólo amarela, a qual presentei-o num dos seus aniversários, ou foi num natal? Num ano novo? Ou não teve nenhuma data especial? A comprei porque achei que combinava com seus olhos azuis, aliás, olhos que mudam de cor conforme o dia vai passando. Vi você, nesta manhã, bem cedinho, em pé naquela estação de metrô, sem se importar com a fila interminável, com a aglomeração tão comum do horário, ouvindo músicas, será que ouvias Elis Regina? Lembro-me que ouvias Elis o tempo todo, sempre elogiando sua voz, que não conhecia outra cantora como ela, que sentia não ter sido contemporâneo dela, e, eu tentando fazer você ouvi Nina Simone. Ah, você tinha um livro nas mãos, quem estaria lendo? Não vi o título ou o autor do livro. Ainda mantinha sua paixão por Clarice Lispector, tão introspectiva quanto você? De manhã, bem cedinho, eu quase descia naquela estação, porque você estava lá, parado, como se tivesse todo o tempo do mundo, como se esperasse alguém ou não esperasse nada e ninguém, e, iria dizer-te que não precisarias mais esperar, eu estava ali. Meu trem foi embora e você saiu da minha visão, mas ficou nos meus pensamentos, como agora, ao deitar. Nem sabes quem eu sou, só sei que existes, como nos meus sonhos. Amanhã, de manhã, bem cedinho, quero voltar a vê-lo naquela estação e saber que também existe, além dos sonhos, outra vez.

(by, franck)

domingo, 26 de setembro de 2010

Para que escurecer o que já anoiteceu?


Para que escurecer o que já anoiteceu? Mesmo que a lua brilhe lá fora, a noite aqui dentro invade cada poro meu, depois que percebi que no mundo há você, não consigo imaginar a felicidade longe de você. Como não estou do teu lado, choro. Sempre. Ontem experimentei uma alegria sem sentido, coloquei a mão sobre o ombro de um amigo e sorri. Só para experimentar a sensação do estado de estar alegre. Percebi a alegria dele ao me ver alegre. Ele então começou a me chamar à atenção para crianças e pássaros e gatos e lagos. Brincamos com um cão vira-lata que passava por ali. Andamos de roda-gigante. Rimos juntos da cara do velho surpreso com nosso beijo. Chutamos lata na calçada suja. No final da tarde, ele me mostrou uma estrela que surgia no céu, talvez a primeira a surgir, mas eu contemplava era os raios do sol que morriam no horizonte. Depois quando a noite finalmente chegou e o gosto de vinho substituiu o gosto de pipocas e algodão doce, concluir que a alegria é muito frágil. É tudo ilusão. Naqueles momentos de risos e brincadeiras da tarde, eu estava num pranto só. Eu chorava por dentro. Eu estava distante de tudo aquilo. Eu estava triste. Eu gritava de dor. Então, o que é felicidade? E o que é infelicidade? Não sei de nada. Não sei de nada. O sentido da vida é não ter sentido. É tudo questão de momento. É tudo um grande teatro. É tudo fantasia. Miragens. A vida é uma grande farsa. Me iludo que não consigo viver sem você porque essa ilusão é necessária para minha sobrevivência. Se teu fantasma desaparecer de mim, como irei justificar uma vida tão vazia? Meus sensores entraram em pane...


(by, franck)

sexta-feira, 24 de setembro de 2010


Há dias que saio de dentro de mim

fecho a porta de entrada

espalho-me por aí

feito chuva

feito ventania

feito pensamento

feito tempo...

Não dou espaço à solidão.


(by, franck)

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Você esteve aqui ou sonhei?


O dia chega devagar e nesse despertar com a casa respirando sono, não sei se sonhei ou se você esteve aqui, comigo. Busco-te ao meu lado, mas não o encontro, apesar da cama desfeita e na minha memória você está vestido com uma camisa de flanela, sapatos velhos, cabelos despenteados... Venta. Ameaça chover. Meus olhos vagueiam em busca de sua mochila na poltrona, suas roupas jogadas, mas não as vejo. Lá fora vendedores gritam maçãs e camarões. Ligo o rádio e o locutor diz que tocará canções de amor nessa manhã de domingo. E em nenhum lugar do mundo pode haver uma manhã tão estranha, pelo menos para mim, apesar de ser setembro, apesar da primavera, entre esse real e divagações. Isso é você, tão secreto e tão silencioso? Ou é apenas o outrora que se acabou? Mas ainda sinto amor na sua ausência, nesta nostalgia dolorosa, como sua última imagem sob um poste iluminando-o com sua mochila nas costas, como se dentro dela você levasse a vida a todo custo, ou nas mãos, com delicadeza, como o violão. Você esteve aqui ou sonhei? Será que os espinhos no peito tem tendência para virarem flores? Que o amor é tanto relembrar seus sapatos velhos como ouvir uma música que insiste fazer lembrar-me você? Desligo o rádio. O amor está nas coisas lógicas como nas mais disparatadas? Levanto-me e olho a chuva. Procuro seu cheiro pela casa já desperta, sinto-o no ar. Não sei se sonhei ou se você, como um fantasma, foi antes dos raios do sol, que não vieram.


(by, franck)

segunda-feira, 20 de setembro de 2010


O animal que quase domino

é a minha necessidade

de não dominá-lo.


(by, franck)

domingo, 19 de setembro de 2010

Num fim de tarde, quase noite...


Relendo Caio, num fim de tarde, quase noite. Depois da chuva. Do sol. De arrumar os livros. De adiar as férias. De fazer um chá. De fumar um cigarro. De sentir falta. De pensar em Buenos Aíres. De sorrir comigo. De pensar em você. De ouvir músicas. De fumar outro cigarro. De pensar em nós.


(by, franck)

sábado, 18 de setembro de 2010

Água & Sal


Conte-me de sua outra cidade, que te contarei dessa coisa estranha e solitária que é viver nesta Ilha sem você. Conte-me de sua nova casa, na qual, você disse-me, há mais salas para receber do que quartos para dormir, que te direi do gosto de metal na boca todas as manhãs. Conte-me de sua paixão, mas não ultrapasse mais a fronteira da intimidade, que te darei alguns truques, pequeninos, que inventei, para te esquecer. Conte-me dos ipês amarelos da sua rua, que te mandarei o perfume das flores do jardim que foi nosso. O jardim que me deste. Conte-me da estação nessa cidade acima da linha do equador, que te mandarei a sensação que meu corpo ultimamente é água e sal, um mar. Não quero o simples ou o complicado, a vida não imita o cinema, mas queria estrelas cintilantes. Plumas. Xerez. Xadrez. Com você, de novo. Um dia. Agora.


(by, franck)

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Achados & Perdidos


("E atravesso os dias, um pouco opaco, com breves iluminações, como há pouco no portão, olhando o céu"... Caio Fernando Abreu)


Recebi hoje sua carta e gosto tanto de suas cartas que, de modo bem egoísta, fico torcendo para que você desafie sua tendinite e continue escrevendo... Falamos, por telefone, em Caio Fernando Abreu, e suas cartas traem essa benéfica influência, elas têm o 'cheiro' e o 'gosto' da escrita de Caio, esse escritor que vou admirar sempre.
Hoje chove em São Luís, como chovia em Buenos Aíres quando você me telefonou. É impressionante como São Luís fica descaracterizado sem o sol, sem as praias lotadas, sem o colorido típico dos verões. São Luís é, definitivamente, uma cidade solar, nua, exibida. E nós, maranhenses, não gostamos também de sinais fechados e nem de dias nublados, como aquela música da Adriana Calcanhoto. O que não tem a ver com 'estado de espírito', ou seja: não há uma relação direta entre o tempo lá fora e o tempo aqui dentro. Tristes ou alegres, felizes ou infelizes, parece que todos nós, maranhenses, concordamos com uma coisa: o sol, o calor, as praias cheias, as cores ruidosas do verão são imprescindíveis.
Adoro quando vou a São Paulo (ou outra cidade de céu nublado) e me deparo com aquela garoa intermitente e deprê tão típica daquela cidade. Adoro a feiúra excessiva de Sampa, sua gente bem vestida, pouco afeita à exposição dos corpos, sua gente fechada e desconfiada, tão diferente da gente daqui... Por dentro, estou sempre garoando, como São Paulo, estou sempre protegido, 'armado', mas, por favor, sou absolutamente solar, necessito das cores exuberantes, das risadas altas, das alegrias forjadas. É um jeito maranhense de ser e de existir e, não tenha dúvida, a 'culpa' é da topografia: como se o desenho das cidades moldasse o humor de sua gente. E molda mesmo. A beleza natural de São Luís, seu clima quente, o fato de ser uma cidade debruçada sobre o mar faz com que seus moradores sejam pessoas diurnas, no que isso tem de mais amplo. Diurnas, no jeito de ser, isto é: expostas, exibidas, alegres (ainda que profundamente tristes), barulhentas e coloridas, quase sempre artificiais (ainda que possam ser profundamente profundas). Ou como diria Oscar Wilde: só as pessoas absolutamente artificiais é que não julgam pelas aparências. Ou qualquer coisa assim...

PS: Não encontrei a continuação desse 'achados e perdidos')

(by, Franck)

quinta-feira, 16 de setembro de 2010


(Em 1990 fiquei fascinado com 'O perigo do dragão', livro de poemas de Bruna Lombardi, no qual tem um poema que é a síntese daquele período, das buscas e perdas de Caio Fernando Abreu, Ana Cristina Cesar e outros... O poema é 'Pra Ana C. e caio e todos nós', lendo esse poema, escrevi o poema abaixo):



Para Bruna e Ana Cristina e Caio e todos nós


Talvez chorar ajude muito sim, Bruna
lendo um de seus poemas ou de Ana Cristina
ou um conto de Caio.
Talvez a salvação viesse em naves espaciais
num telefonema vespertino
nas nossas loucuras
ou lucidez
nas nossas taras, angústias e medos.
Talvez estejamos velhos demais para acreditar em amores
ídolos, signos, búzios e tarô
talvez sejamos jovens ainda
para pular da janela
por acreditar nas pessoas
ideologias e seitas
tantas coisas orientais.
Apesar de tudo
ainda tentamos fórmulas
roupas e outros modismos
talvez assim
quem sabe
dará certo.

(by, franck)

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Receita da felicidade!


(Para um alguém em Buenos Aíres)


Querido, bonito email, só que no seu lugar eu diria: sei que a solidão é eterna. Seria um grande achado existêncial para sua vida. Para a minha, descobri faz tempos isso. Só que âs vezes me esqueço. Pois é. Mas ando pouco existêncial nesses dias. Ando mais empírico, mais os acontecimentos que as teorias. Mais não totalmente, é claro. Para mim tem sido importante tentar criar certas raízes, mas como é difícil construir alicerces, não achas?
Foi bom falar com você também via fone, os emails podem ser próximos, mas podem ser distantes... E posso estar mais perto de você na inconformidade (?) de ter que me sujeitar a um email linear, que escrevendo, escrevendo e não conseguindo dizer-te nada que me importasse que você ouvisse. Tudo vai depressa, ou é o tempo que já é tanto, ou são ambas as coisas? Como eu disse, os emails às vezes nós fazem tão distantes... E é isso. No mais, dou-lhe a receita da felicidade: felicidade é um pastel de goiabada e queijo comido numa caminhada por ruas vazias, numa noite meio fresca, meio fria. Experimente para você ver. Ou, se preferir, felicidade é ser feliz comendo um pastel 'Romeu & Julieta' numa caminhada noturna. Mas aí já é muito reflexivo para mim. Eu fico com o pastel.
Beijos.

(by, franck)

terça-feira, 14 de setembro de 2010

O voo


Não tentei
Mas sei
Nós, aves, morremos dos voos
que não os demos.
[a serena possibilidade do abismo]

(by, franck)

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

"A solidão é um luxo"... Clarice Lispector


Escrevo de um lugar muito profundo, de uma parte qualquer do meu cosmo - ele é tão amplo - sob uma sombra pacífica e serena: minha solidão. Há pessoas que nascem para serem solitárias, de uma solidão inatingível, inenarrável; pois bem, sou uma delas. Estou encerrado, mais do que ninguém - pois ninguém conheço - dentro do meu ser, dentro de mim. E esta angústia, esta ansiedade constante e solidária ao meu isolamento, aos poucos, quase sem que eu percebesse, metamorfoseou-se - a mágica da vida - numa serenidade impressionante, silênciosa. Eu, que, quando me via na perspectiva deste isolamento, ou até quando me via inserido nele, angustiado, buscava, de alguma forma, fugir a ele, hoje me vejo sob sua sombra. Não torturado, nem feliz: sereno, com uma serenidade que nunca me pertenceu e que sequer me pertence. É meramente ilusória: dentro de minha grandeza, uma fúria enorme, magnífica, minha propriedade de há muito; essa fúria, ela de mim apodera-se e põe-me à sua disposição. Ambiciosa. Irrefletida. Genial. Borbulho como em ebulição. Fervo. Consumo-me em minhas cinzas, valem muito mais que eu mesmo. Ou talvez deva dizer que são eu mesmo. Sem elas, sou um ser inútil. Ou melhor: não sou. É difícil, essa convivência. Observo a mesquinhez que há por aí e me espanto. Indgno. Conformo. Ou não. Nietzche disse que o homem é uma corda esticada ligando o animal ao sobre-humano. Uma corda sobre um abismo. Pois bem: eis-me, uma corda que não se satisfez em ficar estacionada sobre este; vibro em busca não deste sobre-humano - um passo além do humano, um horizonte tolo e inatingível por inexistente e móvel - mas sim deste abismo. Ah, esta fantástica e iminente sensação de queda, a impressão de que a qualquer instante, irei espatifar-me no profundo deste fundo; esta é a única maneira de que eu possa, ou melhor, que permite estabelecer uma relação, um intercâmbio entre mim e esse mundo - tão pequenino - que me rodeia. Ou melhor: não tão pequenino assim! Quanto ao resto, de certa forma, pouco importa. O essêncial, eu o disse. Parte do essêncial, talvez. O essêncial deste momento...


(by, franck)

domingo, 12 de setembro de 2010

Quero um andróide, uma mãe d'água, um vendedor de amendoim...

(..."estou farto de semideus! onde é que há gente no mundo?"... Fernando Pessoa)



Vislumbro o que não é chumbo. Me adentro onde não contento. Me amarro mais amaro e quando olho e oro sob o nublado céu desta minha Ilha cá me encerro. Não olhe para meu olhar arrogante. Inscrevo-me agora nesta hora de poesia propiciatória inteiro pra quem quiser me ver. Terno verde ser. Estou assim. Querendo a palavra única. A palavra sem paixão. A palavra de antemão. Sozinho por ruas suburbanas estou. Quero olhar coisas. Um andróide. Uma mãe d'água. Um vendedor de amendoim. Uma máquina polaróide. Não sei se gosto ou não desta Ilha. Angústia. Quero mochila nas costas e ser tipo Adão e Eva no paraíso sem pecado e sem juízo. Às vezes é paz com esse céu que é de sol e também de chuva. O escuro do cinema me salva dos fantasmas e dos lobos com suas danças. Ouço canções dos magos e fadas nas minhas solidões diurnas e noturnas. Às vezes sinto-me um dragaozinho soltando fogo por todos os poros. Talvez por remexer no fundo do baú e encontrar aquela velha saia rendada que provavelmente pertenceu a minha avó - será o meu lado femenino se manifestando? - e encontrei lagartixas, uma foto antiga que me trás recordações... Não quero ser dragão e sim uma borboleta, voar por aí fazendo um balé no ar...


(by, franck)

sábado, 11 de setembro de 2010

Devaneios de uma quase noite


("Em matéria de amor, ainda invento"... Adélia Prado)


Quase noite. Fiquei aqui pensando quando era menino, eu sonhava em viver a realidade dos filmes de aventura. Eu tinha meus heróis, por quem era apaixonado. Personagens criados pela mente de algum homem, tão artificiais quanto a imagem preta e branca reproduzida pelo aparelho de tevê, ou como a voz desarticulada, dublada para o português que eu havia me acostumado a escutar. Naquele tempo, a fantasia tinha um peso tão forte - ou quem sabe até maior - que a própria realidade. Sonhar com meus heróis era realidade bem mais agradável do que ir à escola. Isto aconteceu há muito tempo e eu penso que a única coisa que mudou foi o tipo de fantasia. O que é mais interessante: o dia de um trabalhador ou viver um amor selvagem com um Berbere na Costa Argelina? O que você preferiria, pagar seu aluguel no banco ou conhecer um belo napolitano? Onde você gostaria de estar agora, na pizzaria na qual trabalha ou conversando com uma interessante figura numa praça em Amsterdã? Diga-me, o que é mais excitante? Até um certo tempo achava que minha vida iria ser algo muito interessante, eu não precisaria fazer nada... Era uma simples questão de tempo. Hoje eu ainda creio na fantasia, mas não como algo gratuito, mas como algo a ser conquistado. Sinceramente, eu preciso crer nisto, pois é a única coisa que poderia valer a pena na vida, tudo mais é muito desinteressante. Perdoem-me pelo meu individualismo, mas estou com um caráter reflexivo e pessoal...


(by, franck)

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Uma história de (quase) amor...

-Desculpe o atraso. Essa hora com rush... Essa chuva...
-Tudo bem. Relaxa. Senta... Precisava falar com você. Urgente.
-Não sei o que você tem de tão urgente que não poderia dizer ao telefone...
-Quero dizer assim, pessoalmente, olho no olho... Eu não te amo mais!
-Não me ama mais? Que brincadeira é essa?...
-Não é brincadeira... Falo sério...
-Mas ontem estivemos juntos, fomos ao cinema... Tudo foi tão bom... Quer dizer que você acordou hoje e descobriu que não me ama mais? Assim, como quem vai a padaria?
-Claro que não! Não foi assim! Te dei indícios... Você que não percebeu. O cinema, por exemplo, não foi tão bom assim...
-Sim... Sim... E o que mais?
-Tinha que ser dito hoje, resolver isto com você, viajo amanhã...
-Viajar? Mas íamos viajar de férias, juntos. Fernando de Noronha.
-Estarei de férias amanhã... Antecipei... Viajarei com uma amiga. Vou para o Sul.
-Com uma amiga? Ou amigo? Você andou premeditando tudo isso?
-O que importa se é amiga ou amigo? Não... Nâo premeditei nada. Resolvi tudo isso hoje. Não se aborreça, por favor...
-Quer tomar alguma coisa? Depois de tudo isso, preciso de uma bebida...
-Não... Tenho que ir. Vou arrumar minhas malas. Deixar o cão com minha mãe... Tomar algumas providências, ainda.
-Você pensou em tudo. Ok. Vou ficar aqui, pensando... Tomar algo... Esperar a hora do trânsito livre.
-Mandarei notícias. Um postal. Ah, aqui o seu cd, sei que ouves esse cd desesperamente, sempre Nina Simone...
-Lembrou de trazer até o cd? Estou surpreendido com sua forma de organização... Acho que conhecia, realmente, outra pessoa e não sabia.
-Não vamos brigar agora, por favor, sem mágoas... Me dê um beijo... Tenho que ir, como disse, tenho que arrumar as malas...
-Ok. Ok. Vá arrumar suas malas. Sua vida... Ficarei aqui arrumando meu coração...

(by, Franck)

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Uma história quase amarela





("De tarde um velho tocará sua flauta para inverter os ocasos" -Manoel de Barros)



Gosto dessa cidade porque tudo nela me faz lembrar você: o céu sempre azul, o mar dourado num fim de tarde, as ruas estreitas de paralelépipedos; mas queria a Holanda e seus moinhos, os girassóis, viajar com você por paisagens desconhecidas, atravessar rios e montanhas, sem saber onde estaríamos ao cair da noite. Tenho o vazio das tardes, todas elas. O coração em brasa. Talvez com um futuro sem história, como um rosto que passa num ônibus, parecendo querer exprimir algo,mas que a gente vê uma vez e acaba desaparecendo para sempre. Tomo vinho, como se ele fosse me prometer música, poesia e você. As pessoas perguntam por você. E você me diria que vinho me deixa deprimido. Quero de novo aquela coisa bonita que deixa pasmo o olho e o coração. Suas plantas ainda vicejam na varanda, rego-as todas as noites, gosto desses gostos adquiridos, são sempre melhores. Não quero essas tardes sozinho sem presente e futuro, quero você, de volta, num canto do meu coração e da memória, impecável, e, eu duvidando dessa verdade. Gosto dessa cidade porque tudo nela me faz lembrar você, mas quero você dentro dela. Dessas tardes. Quero um tempo demasiadamente perfeito, como antes, com passado, presente e futuro. Com nossos pontos fracos. Nossas mágoas. Nossos jogos de sedução...


(by, Franck)

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Àqueles dois


Ele, super-herói, escalou prédios. Torres. Pulou pontes.

O outro, no chão, tão comum

Sentando em praças. Cruzando esquinas. Numa fila.

Ele, escafandrista, buscou tesouros. Submarinos. Virou anfíbio.

O outro, na praia, tão comum

Catando conchas. Tomando água de coco. Vendo o sol se pôr.

Ele, artista, andou na corda bamba

Passou em arcos de fogo. Globo da morte. Daniel na cova dos leões.

O outro, na platéia, tão comum

Querendo bis. Aplaudindo. O show não podia parar.

Ele, tão só, em casa

descansando de ser herói

anfíbio

artista.

O outro, num parque de diversões, tão comum

tomando sorvete

olhando a lua, roda gigante.

O super-herói. O escafandrista. O artista, tentando dormir, tão comum

querendo praças, água de coco, roda gigante

com o outro.

O outro, sem saber daquele outro

nos seus sonhos

tinha um herói, um escafandrista, um artista.


(by, franck)

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Água com açúcar


Os dias deles eram doces. Melados. Água com açúcar. Um riacho doce. Uma manhã ele enjoou de tanto doce, saiu para comprar sal. Vagando pela casa, esperando o sal que ele não trazia, ela sentiu. O sal era a ausência que ele deixou. Chorou uma salina. Um oceano. Uma tarde, escreveu na geladeira: 'o doce acabou'. Se decidiu, saiu para comprar um.


(by, franck)

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Doce como algodão doce!


Antes que amanheça. Que o sol desponte. Sonho com você. Comigo. Com nós dois. Sorrio dormindo, ou sonhando. É leve, o sonho. Quase seda. Balões no ar, ávidos, girando. Manhãs azuis. Antes que a lua se vá, sonho. Com você. Comigo. Com nós dois. Sonho, algodão doce. Pôr do sol. Algas. Conchas. Pérolas. Antes que as estrelas apaguem, sonho. Antes que o despertador toque. O telefone chame, sonho. Com abraços. Sorvete. Olhos nos olhos. Nuvem. Flores amarelas. Blues. Jazz. Antes que o medo venha. Antes que setembro termine e venha meu aniversário, sonho. Com você. Comigo. Com nós dois. Uma cidadezinha, no sonho. Uma rua com uma casa e um jardim. Mãos se tocando. Sorrisos. Poesia. Bicicletas. Um livro aberto, esquecido. Cães latindo. Barulho de um trem indo e voltando. Antes que o sonho acabe, sonho. Com nós dois. Teus cabelos. Fotografias nossas. Uma camisa xadrez. Chá. Vinho. Um guia de viagem. Corações nas mãos. Céu azul. Um mar. Indecisão vindo na contramão. E sonho, como se fosse verdade. Há espaços. Vãos. Brancos como algodão. Peles bronzeadas. Anjos. Um cais. Antes que tudo não seja apenas sonho, sonho... Sonho... Com você. Comigo. Com nós dois...


(by, franck)

domingo, 5 de setembro de 2010

Tudo é novo de novo...


Tudo é novo de novo. Por mais que seja sabido. Vivido. Experimentado. Tudo é novo de novo, por mais que tenhamos sofrido. Chorado. Descabelado. Quando tudo é novo de novo, queremos a felicidade que passa de quando em quando. Sem medo de acreditar no bicho-homem. Acreditar que esta felicidade seja eterna com ele, com ela, comigo. Quando tudo é novo de novo, queremos é beijá-lo. Amá-lo. Abraçá-lo. Olhá-lo. Fotografá-lo. Filmá-lo. Poemá-lo. Curti-lo. Perfumá-lo. Senti-lo. Despi-lo. Querê-lo. Envovê-lo. Cantá-lo. Lê-lo. Presenteá-lo. Namorá-lo. Enfeitá-lo. Mimá-lo. Servi-lo. Esperá-lo no porto. Aeroporto. Rodoviária. Em casa. Na esquina. Carregá-lo. Cheirá-lo. Tocá-lo. Vivê-lo. Emocioná-lo. Entendê-lo. Tê-lo, de dia. De noite. Para sempre. Acarinhá-lo. Telefoná-lo. Escrevê-lo. Ouvi-lo. Quando tudo é novo de novo o coração fica colorido. Seda. Alegre. Asas. Carícia. Leve. Que assim seja, amém!


(by, franck)

sábado, 4 de setembro de 2010

Eu preciso sentir que você ainda sente


Estou aqui, neste fim de tarde, neste sábado, vendo o sol se pôr na praia que estivemos tantas e tantas vezes; não mudou a praia, não mudou o espetáculo do sol; o que mudou foi que não estamos juntos. Vejo o mesmo mar, a cidade e os navios sendo iluminados e o sol deixando um rastro dourado. Estou aqui, neste fim de tarde, neste sábado, na mesma pedra, fumando a mesma marca de cigarro, usando a mesma jaqueta marron, porque nesta hora o tempo esfria, há uma brisa mais forte vinda do oceano. Estou aqui, neste sábado, nesta noite, na mesma feirinha da praça na orla que vinhamos tomar sorvete e olhar as barracas de artesanato e degustar comidas típicas e beber uma ou duas cervejas... Estou aqui, em casa, nesta noite de sábado, regando o jardim, alimentando os cães, vendo Juliette Binochi em 'A insustentável leveza do ser' pela centésima vez, ouvindo Nina Simone e Norah Jones, como se vendo o filme e ouvindo-as ficasse mais próximo de você. Estou aqui, nesta noite, neste sábado, escurecido pela tua ausência, definhando feito um animal alimentado apenas com água e essa água viesse em conta-gotas; aqui, com essa mania de não saber ser feliz sem você, e, por favor, não espere meu aniversário ou o natal ou o ano novo para voltar; se você quiser voltar, tentaremos de novo. De novo. De novo. De novo... Eu preciso sentir que você ainda sente. Como eu.


(by, franck)

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Quando há tardes cinzas dentro de mim...


Há tardes dentro de mim que o cinza quer virar negro. Por mais que faça sol lá fora. Tenha céu azul. Saudade é uma palavra que não devia existir na carta geográfica. Do mapa da afeição. Dentro de mim é treva. Trava. Sal. Tento recitar de cor o poema de Martha Medeiros, mas não consigo. Sou um salto sem paraquedas. Não caibo na moldura deste porta-retrato. Não me enquadro nesta casa, quero o vigor das ruas. E sou cinza. Treva. Trava. Você foi um daqueles pratos quentes de queimar o céu da boca. Agora sou leão alado sem juba. Zonzo. Cheirando a mangue. Curtume. Marés. Cinza. Porque não viver essas tardes cinzas como se fosse sequência de um filme de Richard Linklater? Queria um avião sobrevoando minha casa e jogando flores. Um anjo sem harpa e sem asas. Queria olhar nos olhos teus e não vê mais nada. Ar rarefeito. Sal. Trava. Treva. Cinza. Queria um pássaro de fogo no meu jardim, faiscando, nestas tardes cinzas de mim, enquanto o sol, que não vejo, se esvai e se vai...


(by, franck)

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Um poema de Martha Medeiros


o céu parecia cartolina cinza que havia sido mal dobrada
seus vincos, raios
choveu naquele final de tarde uma usina
abriram-se as comportas, as ruas viraram canais
choveu de cima pra baixo, de baixo pra cima e para os
lados
a cartolina virou papel gessado, as nuances rarearam
eu vi um barco
mas o mar se comportou e permitiu que ele atracasse
choveu naquele final de tarde um niágara
dois rapazes atravessaram as águas em bicicletas
não sei se chegaram, havia um charco
o papel gessado virou celofane, trovoadas
água sobre os vidros escorreram, voltaram todos pra
suas casas
choveu naquele final de tarde um atlântico.

(Martha Medeiros em 'Cartas Extraviadas e outros poemas', pag 10, Edt L&PM)

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Caixa de prata


"Nunca lhe ocorreu ter pena de um objeto? Tenho uma caixa de prata de tamanho médio e sinto por ela piedade. Não sei o que nesse silente objeto imóvel me faz entender-lhe a solidão e o castigo da eternidade. Não ponho nada dentro da caixa para que ela não tenha carga.
E a tampa pesada encerra o vazio. Eu sempre ponho flores nas suas vizinhaças para que elas suavizem a vida-morte da caixa - as flores são também uma homenagem ao artesão anônimo que esculpiu em pesada prata de lei uma obra de arte."

(Clarice Lispector em 'Um sopro de vida', pag 125, Edt.Círculo do Livro)

(Quem dá a volta ao zodíaco comigo...)

Previsões dadas...

EU...

Minha foto
São Luís, MA, Brazil
Um brasileiro-nordestino, um cara comum, qlq um, como diria Caetano Veloso...