sábado, 9 de junho de 2012

Doce e Salgado

Você me conta do frio da sua cidade. Para amenizar o calor que faz nesta cidade mais ao norte, sento-me num bar e peço algo gelado, com sabor de limão e hortelã; ao meu lado uma moça negra, sozinha também, muita maquiada, tomando refrigerante diet. Mais tarde, nesta noite, enquanto dirijo de volta para casa, nas ruas completamente vazias, ligo o rádio do carro e toca uma canção da Adriana Calcanhoto: 'eu ando pelo mundo e meus amigos, cadê? minha alegria, meu cansaço? meu amor cadê você?' e penso na moça do bar em algum quarto dessa cidade, esperando um telefonema, como eu.
O outono nesta cidade é quente, não temos nenhuma estação definida, estamos próximos da Linha do Equador. Acordo cedo, com o sol, céu azul, uma brisa e o mar que nos refresca do calor dos trópicos. Decido ir ao mercado central, uma amiga me falou desse mercado e nunca estive nos mercados centrais e quero ver as pessoas tomando café da manhã, partirem o pão, escolherem as frutas, os legumes, as carnes, se relacionarem. Preciso aprender a ver a beleza da vida neste lugar. Um prazer solitário. Me encanto com as cores, os cheiros e o burburinho. Quero conversar com as pessoas como quis com a moça negra. Mas apenas olho, observo, rio, recito algum poema que sei. Sou doce e salgado neste sábado. Com um único toque me transformaria em fruta madura e cairia da árvore. Mas atravesso outono como se fosse verão. Imagino seu frio. Você agasalhado. Uma música brega toca no mercado e uma música brega sempre quebra o encanto.
Paro numa banca no caminho de casa. Vejo meu livro exposto. Compro revistas. Cigarros. A rua está vazia e tudo está quieto, só se ouve o farfalhar dos jornais e das revistas. Olho a capa de uma revista, uma revista pornográfica, duas mulheres segurando chicotes. Tenho que chegar em casa, a moça da faxina me espera. Lembro de algo que li no qual dizia que 'o capitão voltou de suas viagens aos mares do sul. das Índias Ocidentais'... Me sinto assim, após ter estado no mercado central, mas você ainda não chegou para iniciarmos nossa viagem. Deixarmos as peças desse romance caírem livremente, colidirem e se acomodarem de alguma forma. Cada um de nós é um segredo para o outro.
O dia passa. O calor mais acentuado com o aparente deslocamento do sol. Recebo suas mensagens, um ritual estabelecido. Quero ir ao cinema. Quero receber uma amiga para tomarmos vinho, mas vinho não combinaria com o calor desse sábado. Penso em como eu e você somos mais parecidos do que diferentes. Com você moraria aqui, São Paulo, Dakota do Sul, Sibéria, África. A noite é fresca, tem lua e estrelas, quero ir ver o mar, é uma noite simplesmente bonita demais para se ficar enfurnado entre quatro paredes, mas você deve estar entre cobertas, na sua cidade, e, apesar de estarmos no mesmo país como o clima e tempo são tão diversos. Há Brasis dentro de um Brasil. Imagino você com seus olhos claros, pedrinhas coloridas que vêm do mar, o mar que você não têm, entre cobertores. Neste momento as sensações do dia e outras mais antigas se espatifam como vidro, como gelo, por não tê-lo neste calor tropical, nesta Ilha, perto deste mar, nesta noite, entre cobertas da sua cama que poderia ser a nossa.
(by, franck)
(imagem: franck)

terça-feira, 5 de junho de 2012

A felicidade não tem endereço

Recebi a visita de uma tia que mora no Sudeste. Fomos a uma vila de pescadores comprar artesanatos, frutos do mar e olhar os barcos. No fim de tarde, choveu e uma neblina atípica para a cidade e um lindo arco-íris nos saudou na volta para casa. Paramos na auto-estrada, numa chácara, para apreciarmos o espetáculo da natureza e tomarmos chocolate quente, saborear bolos típicos e nossas presenças. Falamos do jantar que faríamos com os peixes e os camarões, frescos, recém-comprados, do vinho que nos esperava, do calor e do colorido que nos encantou das mantas, redes e roupas embrulhadas para presentes.
Recebi um telefonema de um amigo, no domingo, quase noite. Estava no aeroporto, minha tia ia partir, talvez retorne no próximo ano e teremos o mesmo ritual de passeios, compras e jantares. Como se com isso tivéssemos um acordo, um pacto silencioso. Mas o meu amigo convidava-me para irmos ao circo, convite incomum desse que curte baladas e outros leros. O ir ao circo me remeteu a infância, no interior, quando ia ao circo ou cinema com meu pai; quando voltávamos de mãos dados, calados, nas ruas quase desertas daquela cidade pequenina, daquelas noites, tudo pra mim tão mágico e encantador.
Recebi um convite para viajar. Uma semana viajando com amigos, de carro, até uma praia quase deserta no litoral do Piauí, Delta do Parnaíba. Quero essa aventura de sol, sal, brisa, areia; quero uma semana regada com papos e companhia e aconchego de amigos de décadas. Assim, sem lenço e sem documentos, mas a sensação da busca da felicidade... Essa mesma felicidade que recebi de três formas distintas nesta semana, sem receitas, sem menu. Ela, a felicidade, chegou com uma pessoa querida, com um circo e suas lembranças, com uma viagem de amigos.
Recebi a felicidade e ela não tem endereço, reside na casa das possibilidades, essa semana ela aportou por aqui.
(by, franck)
(imagem: internet)

(Quem dá a volta ao zodíaco comigo...)

EU...

Minha foto
São Luís, MA, Brazil
Um brasileiro-nordestino, um cara comum, qlq um, como diria Caetano Veloso...