sábado, 30 de outubro de 2010

Moço, acho que vi você...


Moço, essa manhã acho que vi você, naquela praça que os vândalos destruiram os bustos dos imortais da academia maranhense de letras, lembra? Eu estava num sinal, quando atravessei a rua, não mais o vi, ou não era você, moço? Foi apenas minha vontade de revê-lo? Fiquei procurando sinais que indicassem que esteve ou estaria ali, na praça, entre pombos, na banca de revistas, no caixa eletrônico. Mas o perdi de vista. E você me perdeu do seu coração, moço?
Moço, essa tarde acho que vi você, naquela sorveteria da praia. Não quis acreditar na minha sorte ou na coincidência de vê-lo duas vezes no mesmo dia. Vi você dando risadas e estava acompanhado. Mais uma vez estava do outro lado da rua, via o por-do-sol, e, quando cheguei na sorveteria, vi um carro se afastando. Ou não era você, foi apenas minha vontade de vê-lo, moço?
Moço, será que o acaso fará nos encontrarmos hoje a noite? Estou naquele restaurante japonês, lembra? Sexta-feira nessa Ilha abaixo da linha do Equador, calor, quero tomar um porre de saquê, rir, ter você de volta, porque sinto saudades da nossa felicidade e do futuro que não tivemos... Moço, prometo não perdê-lo de vista se vê-lo de novo. Agora. Aqui.

(by, franck)

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

(Para lê ouvindo Ceumar cantando 'Meu Mundo')


Meu mundo

A beleza pode está no nosso silêncio. No que é transitório. No jeito de reinventar-se. De querer atingir o essencial. A beleza pode está em olhar pela janela e vê um adolescente sendo levado sentado em cadeira de rodas. O sol está forte. Para um dia de sol, minha rua está iluminada. É a noite transfigurada pelo sol que sobe e a tudo lança, indiscriminadamente (indiscretamente?) sua luz. Ou a luz de uma lua e céu abundantes de uma luz mais discreta. Esta pode ser uma beleza dos astros. Esta é a minha tarde, quando as luzes da noite foram pensadas e assimiladas e podem brilhar com maior intensidade. Meu mundo. Minha janela. Minha beleza. Na noite, as presenças não são tão claras, mais insinuadas. E quem disse que o mundo não é uma grande abóbada, uma grande cúpula? Tudo é uma questão de se atirar as pedras no lugar certo. Para além do encantamento da minha beleza e do meu mundo na minha janela numa tarde luminosa. Essencial.
(by, franck)


segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Para ele


Hoje tenho certeza absoluta ter sido enganado pelo tarô que ele jogou... Hoje escrevo para dizer que sinto por não ter vivido com ele aquela paz de um cair da tarde numa praia, o ócio dos piqueniques numa manhã de domingo, o vento nos nossos cabelos num passeio de jeep pelo litoral maranhense... Gosto das simplicidades e de alguns clichês, porque não? Não queria pedir mais do que ele tinha, assim como não daria mais do que dispunha.
Eu e ele traçamos esboços, tateamos traços e promessas; restaram alguns filmes, alguns livros, algumas músicas, algumas cartas, algumas imagens... As delicadezas que se amontoaram na memória, na alma, no coração; Melhor escapar deixando algumas lembranças? Eu pensei em tudo mais limpo, mais claro, mais blues...
Hoje escrevo para ele e parafraseando Caio Fernando Abreu digo que 'talvez eu só precise de férias, um porre e um novo amor'... Ou não ter nada além deste amplo vazio que poderei deixá-lo assim, sozinho em si mesmo, completo, total...

(by, franck)

sábado, 23 de outubro de 2010

GATOS & BAILARINA...


Manhã nublada. Ouço Tulipa Ruiz, que me interessa mas não anima. Minha casa está um caos, 'sem a dignidade de um castelo', parafraseando Clarice Lispector. Queria aprender a beleza do que é transitório, mas a memória é maior que o homem. Lembrei-me da rampa que dá acesso à garagem do prédio que trabalho e na qual existem muitos gatos, muitos deles muito lânguidos; ficam estendidos à espera de afagos e ontem, olhando-os com um outro olhar, pareceu-me que eles se impregnavam dos afagos que recebiam, como se eles, através de tantas mãos, se transubstanciassem, cada um deles, em pequenas languidez miantes. Pensei em gatos, nesses gatos, pensei na minha casa e na bailarina que ergueu seu braço e, eternizado o que deveria ser somente um gesto, cria musgo sob as axilas...


(by, franck)

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Noturno


Mais uma vez anoiteceu. Sinto falta de você, de um efetivo romance, mas existem romances serenos? Pois não gostaria de grandes turbulências, nem das pequenas, acho. Um lago, não um mar, mas onde eu pudesse descobrir, talvez por acaso e absolutamente encantado, a profundez e riqueza de um oceano.
Esse noturno. O noturno das coisas. O noturno da natureza. A terra crua, desnuda do cimento da cidade. Eu desnudo de você.
Não quero ser cético e distante, como um girino que recolhe a cauda somente para adaptarem-se nele as patas traseiras, que lhe serão mais úteis num mundo que não só é de água acolhedora, mas também de terra, terra por vezes anerosa e seca, e, também repleta de predadores.
Mais uma vez anoiteceu. Eu desnudo de você!


(by, franck)

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Uma história quase azul

A primeira vez que se viram estavam no estacionamento do prédio. Ela vagamente familiar para ele. Ele totalmente desconhecido para ela. Madrugada. Olharam-se desconfiados, e, se perderam ali mesmo. Uma semana depois, numa tarde de sábado, se reencontraram esperando o elevador, ela com compras; novamente a sensação que a conhecia, mas de onde? Ele, vindo da praia, ela lembrou que o já vira, mas onde? Desceram no mesmo andar, apenas os dois, silenciosos; mas ela não conseguia carregar todas as compras, no que ele ajudou. Moravam de frente um para o outro, como não tinham se cruzado outras vezes? Ela agradeceu a ajuda, sorriram, e, cada um foi viver o que restava daquele sábado, coincidentemente, dentro de seus apartamentos. Mas naquela noite ele soube de onde a conhecia, quando ligou a tevê, ela estava lá, na novela, e, no apartamento do outro lado do corredor.
Apartir daí, se reencontraram sempre, como se tivessem combinando horários. Os sorrisos, os acenos, foram fluindo. Ela era a atriz do momento, mas sempre sozinha? Ele se indagava. Ela cada vez mais querendo saber daquele homem tão bonito e aparentemente tão sozinho. Não se sabe quem tomou a iniciativa, se foi ele que perguntou com quem ela ficaria no final da novela, se ela que bateu na porta dele num domingo à tarde, pedindo que ele trocasse uma lâmpada no apartamento dela. Sabe-se que o destino, o acaso, ou qualquer outra denominação que seja, conspirou, e, quando viram estavam naquele fim de tarde de domingo,tomando vinho, contando suas histórias, suas vidas: Ela recém-chegada de outro estado, era a atriz revelação, a descobriram num teatro, sentia-se perdida e sozinha naquela cidade, mesmo com o ritmo intenso das gravações. Ele, saindo de uma relação, ainda com algumas cicatrizes, trabalhava com publicidade, por isso, seus horários de trabalho variavam tanto.
Na semana seguinte, se telefonaram. Se viram num café, rapidamente, numa folga dela: Ela tomou água com gás, ele dois cafés com leite; ela fumou três cigarros sabor menta, ele a convidou para jantar. Ele cozinhou para ela, enquanto ela falava de seus pais, da cidade serrana no sul do país que passou a infância, que trabalhar na tevê era uma profissão como as outras; ele contou que tinha ido a cidade da infância dela passar umas férias quando adolescente, que tinha passado um ano em Barcelona, que teve cinco cães quando criança.
Os encontros se tornaram uma constante, passavam fins de semana entre lençóis, ouvindo rádio na madrugada. Na pousada onde se refugiavam, ele leu poemas para ela, ela chorou, disse que chorava mais de alegria do que de tristeza. E vieram os cinemas, os teatros, descobertas de ambos, as primeiras brigas, as reconciliações, a viagem dela para o exterior com a gravação do final da novela.
Naquela noite chuvosa, quando ela retornou da viagem ao exterior, quando ele foi buscá-la no aeroporto, quase não conseguiu chegar perto dela, com os flashs e jornalistas a sua volta; com ela distribuindo sorrisos e falando ao ouvido do ator que contracenava com ela na novela. Na volta para casa, um silêncio interrogativo, uma possibilidade remota da felicidade deles, tinha quase acontecido, ele soube que não eram mais um casal, havia ocorrido o que ele temia.

(by, franck)

domingo, 17 de outubro de 2010

Se você tivesse chegado...


Se você tivesse chegado teríamos ido assistir 'Comer Rezar Amar'. Teríamos tomado sundae de maracujá na saida do cinema. Veríamos um céu seda-blues ao cair da tarde, antes de brotarem as estrelas. Teríamos jantado naquele restaurante à beira-mar no qual tocam músicas francesas. No digital do relógio 02.35h. Recolho minhas emoções. Minha insônia. Meu dia sem você. Ah, se você tivesse chegado...


(by, franck)

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

A carta


Recebi tua carta, queria responder com urgência, mas não sei o que dizer. Essa loucura me faz tão bem. Pura magia. Tenho uma urgência de quem procura ser infinito numa estrada finita e tenho visões de pássaros. Formigas. Gigantes. De nós dois. Minhas mãos tremem. Não quero pensar em nada. Como fazer para não pensar naquilo que se está pensando? Quero te dá um beijo doce, ou agridoce...


(by, franck)

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

A felicidade é doce!


Receber de presente 'A misteriosa chama da Rainha Loana' de Umberto Eco + provável sorvete de tangerina + cartinha acompanhando o livro + falar e te vê no skype + telefonar-te ao meio-dia + mistérios que há de sempre pintar + eu e você = Felicidade completa!


(by, franck)

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Aniversário!


Não gosto muito de aniversários, nem os meus e nem os dos outros, mas esse meu aniversário tem um gostinho especial, como disse Adélia Prado: "Quarenta anos, não quero a faca nem o queijo, quero a fome". E, quero a fome, sempre, do olhar e do sentir e do coração e da alma e do viver...
Sei que sou limitado, sim, mas não importa, ao quarenta quero entrar para a política, agarrar a história pelo pescoço e sacudi-la até ela gritar. Quero comprar uma ilha e construir barcos. Quero casar com quatro homens, três grandes e um pequeno e quero um alfarrábio em Marte e beber um bar até secá-lo e acordar na manhã seguinte e descobrir que sou membro da Família Real. Quero ter meu próprio programa de televisão-uma hora todas as noites à meia-noite, fazendo exatamente o que quero fazer. Quero muitas rosas e muito vinho. Quero que as pessoas parem de cuspir pelas ruas como se tentassem cuspir a poluição, seus medos, suas angústias e tristezas. Quero me acostumar com o verão, quando adoro os dias e noites chuvosos e frios. Quero tomar decisões românticas, como mandar poemas, acender velas, telefonar dizendo que estou com saudades. Quero percorrer o Brasil e o mundo de carona com um amigo(a), só de caminhão. Caminhão de verduras, de frangos, de colchão de molas. Quero viver um duradouro agora, um 'modus vivendi' em seu torvelinho de drogas leves, trabalho por sobrevivência e ócio, mas quero saber tocar também um instrumento. Sou limitado, eu sei, mas quero o sacrifício de tentar a vida toda para conseguir a garantia da monotonia. Quero ser feliz, apenas, e, vou dizer-te o que eu quero, quero ser meu próprio guarda-costas...
A gente é o que a gente gosta: nossa comida preferida, os filmes que a gente curte, os amigos que escolhemos, as roupas que a gente veste, a estação do ano preferida, nossos esportes, as cidades que nos encantam... Eu sou outono, disparado, e, ligeiramente primavera. Estações transitórias. Sou Almodovar. Sou Caetano Veloso. Sou Martha Medeiros. Sou Clarice Lispector. Sou Caio Fernando Abreu. Sou pães, queijos e vinho, os três alimentos que eu levaria para uma ilha deserta, mas não sou ilha deserta: sou urbano. Sou bala azedinha. Sou coca-cola. Sou camarão com quiabo. Sou filé com fritas. Sou sorvete de jaca. Sou bacalhau ao forno. Do churrasco, sou o pão com alho. Sou livros. Discos. Dicionário. Sou guia de viagem. Revistas. Sou mapas. Sou internet. Já fui mais tevê, hoje sou mais rádio. Mpb. Loung. Cinema. Cinema. Cinema... Sou azul. Sou cabelo enrolado. Reggae. Sou jeans. Sou balaio de saldos. Sou ventilador de teto. Sou jeep. Bicicleta. Sou a pé. Sou tapetes e panos. Sou abajur. Bloqueador. Não sou de academia, mas de capoeira. Sou mar, mas não sou areia. Sou Londres. Pirinópolis. São Luís do Maranhão. Sou mais cama que mesa. Mais dia que noite. Mais fruta que flor. Mais doce que salgado. Mais música e um pouco de silêncio e solidão. Mais pizza que banquete. Mais caipirosca que champanhe. Sou delírio. Sou eu mesmo.

(by, franck)

sábado, 9 de outubro de 2010

Amor, mais nada!


Não quero o amor como uma entidade. Quero o amor como um milhão de coisas, pequeninas ou não, mas que venham e cheguem e sejam amor, mais nada. O amor é um olhar castanho distante. Um peso de papel que reproduz o globo terrestre. As flores de um ipê branco caindo numa manhã. Cheiro de pão assando às cinco e meia da tarde na padaria da esquina. Um telefonema a meia-noite para dizerem que estão com saudades. A voz de Nina Simone cantando Angel. As folhas secas que o vento varreu para dentro de casa. Um poema de Ira Buscacio. Um tênis all star amarelo numa fotografia. Uma cama desfeita ao meio-dia e um copo d'água pela metade. Um livro de Tati Bernardi aberto na página 49. Um girassol solitário murchando na cozinha. Uma máscara mexicana na parede vermelha. Uma rede na varanda numa tarde de sábado. Um gatinho branco andando no muro como um equilibrista. Uma frase de Caio Fernando Abreu deixada no orkut por Sil. Dirigir ouvindo poemas de Manuel de Barros. O escurinho do cinema numa sessão as duas da tarde. O silêncio da casa num dia de domingo. O azul do céu nas manhãs de outubro. A espuma do mar ao cair da tarde molhando seus pés. Um beija-flor no jardim. Um choro de criança na madrugada. O amor é isso, é muito mais, ou mais nada...


(by, franck)

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Desejei matá-lo por dentro e por fora de mim


Quando desci as escadas daquele prédio antigo, por isso sem elevador, no centro da cidade, quase dez horas da noite de uma sexta-feira chuvosa, desejei matá-lo por dentro e por fora de mim. Fui andando na chuva até a minha casa, esquecendo o meu carro e minha auto-estima; mas o seu sorriso, seu cheiro, seus cabelos caindo nos olhos azuis, não conseguia esquecer, nem ele me dizendo que estava apaixonado por outro, e, deixando escapar o nome dele: Beto. Para o inferno se ias me deixar daquele jeito, eu precisava de motivos e cheiros e profissão e signo...e Beto virou minha obsessão, passei a noite escrevendo Beto no orkut, google, facebook, badoo, radar, e, todas as mídias de relacionamentos disponíveis e que ainda iriam inventar, mas precisava saber quem era esse tal de Beto. E Beto poderia ser o paranaense de trinta anos, artista plástico que fazia umas aquarelas sem cor; Beto era um gogoboy paulista, musculoso, que dizia topar todas; Beto, no google, era um ator carioca, gostava de rave e se dizia bi; Beto, dezoito anos, maconheiro e morava no mesmo prédio dele; Beto, meio hippie, baiano, num blog com posts sobre paz e amor; Beto, estudante de Letras, do interior de Minas, deixou como depoimento no orkut para sua amiga um poema do Neruda; Beto, brasileiro em Portugal, com seu namorado gringo; Beto, era alguém que dormia, enquanto minha dor e raiva e desespero me consumiam como o sono, os cafés e os cigarros, todos, naquela noite. Beto, como todos que fantasiamos merecer um amor, tinha o amor que eu quis e queria, e, provavelmente iria continuar indo com ele ao cinema, praia, rindo de suas piadas, passeios na orla ao cair da noite e viagens nos fins de semana. Provavelmente, também, iria encontrá-los qualquer dia numa rua, num bar, num teatro, e, então, saberia quem era Beto, o que ele tinha; só esperava que quando isso acontecesse minha vontade de matá-lo por fora e por dentro tivesse sido concretizada e que outro fosse ele na minha vida, e, que o Beto não fosse mais essa obsessão.


(by, franck)

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Convite para um alguém em Fortaleza


De Fortaleza, nesta noite, venha voando,
sobrevoando os acidentes. Injustiças. Carros. Florestas.
Navios. Misérias. Mas venha voando.
Aqui, nesta cidade, mais ao norte,
tem sol, céu azul, ruas estreitas.
Podemos chorar. Nos amarmos. Nos queixarmos.
Ou jogar o jogo de estarmos sempre equivocados.
Venha voando
feito um cometa à luz das outras estrelas.
Aqui, te conduzirei com cuidado pelos meus sonhos abstratos
praias, ladeiras, igrejas, escadas, torres, quartos.
Venha voando
porque há um abismo em cada olhar. O seu é porto seguro.
Venha voando
para que tenhamos um estado sólido de amor e paixão.

(by, franck)

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Uma casa, um porão e nós dois...


Naquela tarde que fui visitá-lo, disseram que ele tinha enlouquecido. Que ele desceu para o porão desde a manhã, que recortava figuras coloridas das revistas e as colava nas paredes. Quis vê-lo, mas não deixaram, fiquei no jardim, tomando chá, tinha atravessado a cidade, como num ritual, numa tarde de chuva, para vê-lo. Fiquei ali ouvindo o burburinho daquela casa ao cair da noite e aquela angústia crescendo no peito por causa dele, lá no porão. Fiquei ali pensando que ele disse sempre o acharem estranho com aquele olhar para o vazio; aqueles livros existencialistas; aquelas conversas sobre o cosmo e astrologia e astronomia; aqueles filmes em branco e preto, antigos; aqueles sons de oboé e cítara e harpa que varavam suas noites insones e os portões, e, aquela solidão de quem nunca será amado; até aquele nosso encontro, em frente a sua casa. Ele estava no jardim, tomando café e dando sobras de biscoitos aos pássaros, quando parei para ouvir a música, desconhecida, vindo da sua casa, que invadia aquele início de manhã. Ele se aproximou, convidou-me para entrar, tomar café com ele, ouvi músicas como aquela, e, nossa solidão de quem tinha perdido as esperanças, foi preenchida por manhãs e tardes e noites e madrugadas de nós dois, naquela casa antiga, na qual ele dizia que os fantasmas espreitavam nosso amor, na qual os sons de pássaros se confundiam com as músicas tocando, na qual os raios dourados do sol ou o luar nos encontravam perambulando por salas, quartos e naquele porão que ele agora estava.
Naquela tarde que fui visitá-lo, disseram que ele tinha enlouquecido, como alguém enlouquece? Será que ele começou ao dizer-me que nos meus cabelos tinha borboletas todas as manhãs? Quando começou a ser visitado nas madrugadas por seres de outros planetas, que cúmplices, segundo ele, falavam de nossa paixão? Ou naquela tarde que disse ser um rei, até disse qual era o rei, vestiu-se como tal, e, que a casa era um castelo e lá fora tinha inimigos, que precisávamos nos proteger no porão?
Naquela tarde que fui visitá-lo, como todas as tardes, como um ritual, fiquei olhando o jardim, os pássaros, as coisas acontecendo após a chuva, como as luzes da rua e das casas sendo acesas, as pessoas voltando ou indo com seus guarda-chuvas e chorei por nós dois, porque ele estava no porão e eu que deveria estar lá, desde a manhã, recortando e colando figuras coloridas pelas paredes.

(by, franck)

domingo, 3 de outubro de 2010

Qual carta do tarô é a do encontro?


Ontem sonhei que você jogou tarô e que as previsões foram nosso encontro. Por isso, espero-o aqui em São Luís, mas poderia ser em Fortaleza, Lençóis Maranhenses, París, Jericoacoara; que importa a paisagem geográfica se a paisagem humana estiver ao nosso lado? Ou você me espera aí para banhos de chuva, pudim de leite, poemas e cigarros na madrugada, piqueniques aos domingos? O espero aqui lendo Bandeira, Adélia Prado, Pessoa; mas eu poderia ser aquele porquinho da Índia, equilibrista ou um mágico, só para você, aí, ou na China, Pirinópolis, Belo Horizonte, Barcelona. Você me espera ouvindo Arnaldo Antunes, numa manhã ou tarde qualquer, e, eu aqui, o espero ouvindo Bob Dylan, Chico Buarque, Nina Simone, Elis Regina... Pensando em fogueiras, gaitas, luar, nenhuma solidão, uma viagem de jipe pelo litoral nordestino. O espero aqui, ou você aí, para festejar nossos aniversários, passeios de barco e de bicicleta, boca na boca, dois olhos castanhos perdidos em dois olhos castanhos... O espero aqui, ou você me espera ai? Antes ou depois do pôr do sol?
(by, franck)

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

A moça da casa à beira mar


A moça, ali, no meio da sala, sentada numa cadeira de balanço, na quase manhã. Tem os pés descalços, ela andava descalça, não se preocupava com detalhes como sapatos, gostava do prazer de sentir e estar em contato com o solo desde criança, e, agora, naquela casa, de frente para o mar, na qual morava não sabia desde quando, saia ao amanhecer e anoitecer, sentindo a água salgada nos pés, a areia, os seixos, as ondas... A moça usava um vestido vaporoso, florido; ela também gostava de roupas leves, coloridas, com flores; flores nas roupas, nos cabelos, nos vasos enfeitando a casa, no jardim que cultivava, sua pequena botânica; na qual se perdia com os cheiros, cores, sons e as visões de pássaros, borboletas, lagartas e outros desconhecidos da fauna que a visitava. A moça, na quase manhã, estava sentada naquela casa, ouvindo o barulho das ondas do mar, naquela sala aos poucos invadida pelos raios do sol, sem saber em que ano estava, ou o mês ou o dia. Olhava a parede à sua frente pintada de vermelho, nem sabia quando aquela parede mudara de cor, lembrava apenas de um azul pálido; como que música era aquela que tocava como uma cantilena, um mantra, desde sempre, naquela casa; que objetos eram aqueles espalhados por poltronas e mesas e cadeiras: lenços de seda, um guia de viagem, uma mala entreaberta, moedas estrangeiras antigas, cartas manuscritas em envelopes com bordas verde e amarelo, diários, livros, um mapa de alguma cidade desconhecida, fotos, muitas fotos, e, em todas elas, a moça sempre sorridente, mas não lembrava quando e nem onde foram tiradas, nem quem era o homem que aparecia em todas elas; não lembrava ter cruzado além das pontes da cidade que morava, se é que sempre morou, tudo era bruma para a moça. Naquela quase manhã, pensou em olhar-se no espelho, maquiar-se, trocar o vestido florido por outro, calçar sapatos; ela, que não se preocupava com esses detalhes, mas sentiu uma súbita vontade e necessidade de fazer essas coisas, como se alguém fosse adentrar a casa para tirá-la daquela letargia na qual estava inserida. Buscou as horas, mas os relógios pararam naquela sala, naquela casa; ao longe cães latiam, no jardim pássaros cantavam, o mar a chamava. Aquela quase manhã para a moça parecia sonho, livro, filme, coisas assim, por isso, ela não sabia se ainda existia.

(by, franck)

(Quem dá a volta ao zodíaco comigo...)

Previsões dadas...

EU...

Minha foto
São Luís, MA, Brazil
Um brasileiro-nordestino, um cara comum, qlq um, como diria Caetano Veloso...