sexta-feira, 5 de outubro de 2012

"Tudo vale a pena, quando a alma não é pequena." (Pessoa)

 (Texto para a Corrente Literária: 'O que vale a pena ser?')


Valerá a pena ser quando ele vier para comemorarmos meu aniversário, o que não vale a pena é morrer de saudades, apaixonado que sou, esperar ansiosamente outra vez tê-lo, revê-lo, tocá-lo, sentí-lo.
Quando ele vier, fingiremos sermos ricos num sábado à tarde e sairemos às compras. Pegaremos táxis. Tomaremos um chá. Andaremos num dia qualquer desta primavera pelas ruas sentindo uma onda de desejo pela cidade quando os sinos das igrejas repicarem, o cheiro das maçãs argentina invadir nossas narinas das bancas nas esquinas, ouvi uma adolescente cantarolando Paula Toller.
Quando ele vier, no meu aniversário, para fazer valer mais a pena sermos, vamos viajar de navio, num roteiro desconhecido; quem sabe nos embrenharemos na Floresta Amazônica, atravessaremos a América do Sul a pé, escalaremos o Himalaia. Talvez moremos numa cabana à beira-mar e nos tornaremos pescadores. Venderemos nossos bens e passaremos fome. Voaremos. Nos arrasteremos por desertos. Andaremos de esqui. Trocaremos de parceiros. Cometeremos suicídios. 
Mas, quando ele vier se nada disso acontecer para sairmos do lugar comum, estar com ele, na rotina dos dias iguais, já valerá a pena ser e tê-lo, aqui, cara-a-cara com nossas almas.

(by, franck)
(imagem: net)
(

domingo, 9 de setembro de 2012

Sob o mesmo azul (Para Thiago)


Não partimos ainda. Nem ele. Nem eu. Ele permanece sob o céu do Planalto Central e eu caminho numa praia de uma manhã sob o céu do Nordeste. Mas temos a mesma solidão, a mesma luz, as cores fortes ou desbotadas das ruas ou das paredes que nos rodeiam. Mas poderíamos capturar os tons e sobretons das nossas solidões, nossas esperas, ang
ústias e desesperanças.
Não partimos ainda. Nem eu. Nem ele. Mas damos voltas por dentro dessas cidades e noites vazias. Imagens da viagem surgem no silêncio da plataforma. Qual a máquina de moer que nos tritura, que nos oprime, incontrolável? Será que sempre vivemos em descompasso com a vida e o mundo? Será que ainda somos nós?
Ainda teremos tempo para acertarmos os passos?
Não partimos ainda. Nem ele. Nem eu. O mesmo céu ainda nos protege? Devemos paralisar o apito do trem? Ou a melancolia de algo impenetrável? Momentos reaparecem, provocados por fatos banais como o cheiro de malbec. Ou de uma flor. Um papel amarelado. Um cartão telefônico. Uma fotografia. Um livro. Um filme. Uma palavra. Um sorriso. Adele cantando 'On and only'. Uma casa. Um rosto. Um trecho de uma música de Marcelo Camelo. Uma janela fechada...
Não partimos ainda. Nem eu. Nem ele. Apesar do mesmo Sol. Da mesma Lua. Da mesma chuva. Do mesmo azul. Das mesmas músicas. Não partimos ainda, mas um fio invisível nos mantém unidos, sob o mesmo céu.
(by, franck)
(imagem: internet)

sábado, 25 de agosto de 2012

Na noite escura
a casa iluminou-se
com o verde dos teus olhos.
A cama
uma ilha dentro dessa ilha
a vida ainda é colorida
acordo azul.
(by, franck)
(imagem: internet)

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

(Texto para a corrente literária: 'O que dura pouco para você?')




Dia desses a folhinha, o celular, o computador, o jornal, a agenda de compromissos informaram que era uma quinta-feira de agosto e naquela quinta conheci mais um 'futuro-nunca-namorado'. Sei que não se pode chamar de conhecer esses encantamentos instantâneos e unilaterais, mas não sei como substituir conhecer por outra coisa. Quando o vi, comecei a tecer hipóteses, passados e futuros, e, no início da noite daqu...ela quinta-feira a cidade se transformou em um show, um show colossal com seus ônibus e táxis e carros e pessoas apressadas andando nas calçadas, as lâmpadas acesas das lojas, bares e avenidas em plena tarde, e, eu ali, encantado com os efeitos sonoros de buzinas e vozes humanas e a presença dele.

Ele conversou e riu e gargalhou. Falou, gesticulou, fez que ia embora. Não foi. Foi. Eu continuei sentado, olhando ele ir e o espetáculo do cair da tarde, os amigos em comum, o que horas atrás havia sido um sorvete de jaca e o copinho caido na calçada (nada ecológico), o qual ele passou por cima e por cima dos meus devaneios, para não mais voltar. Oito dias é tão passado quanto dez minutos ou um mês atrás.

(by, franck)Ver mais

sábado, 21 de julho de 2012

Uma carta para T...

Você disse que viria num sábado. Não sei quantos sábados se passaram e quantos ainda virão até sua chegada. Você, pássaro-hippie, pouse na minha ilha, numa manhã na qual os acrobatas estarão pelas ruas imitando balões de alto voo. Se vieres à tarde, chegue quando o tráfego diminui e o levarei ao bairro marinheiro para vermos os navios iluminados, quando o ar fosco espera a noite chegar com aquele cheiro cansado de fim de dia, poeira, fumaça, do sol fugindo de calçadas e muros. Ou venha na noite, desde que seja sábado, desde que na praça fiquemos soltando nossas almas, olhares, fogos de artifício para os ares cruzando com os acrobatas-balões da manhã que ainda estarão lá, e, seríamos eles, seríamos pássaros, estrelas, objetos não identificados no céu da cidade.
Você disse que viria num sábado. Desde então os outros dias da semana perderam importância, aos sábados tenho sobressaltos desde o amanhecer, porque busco-o no toque do telefone, num avião cruzando os céus, na campainha da porta quando chama inabalável e forte, numa buzina de um carro na rua... Na madrugada quem sabe você ainda chegará, justamente naqueles momentos que a solidão se insinua de mansinho num poema, numa música, num filme, num canal de tevê, no escuro do quarto? No escuro do quarto quero brilhar com você, virar Cheshire ao contrário, o gato de Alice, ser só sorrisos sem me desintegrar. Brilhando e rindo, não serás mais pássaro-hippie, seremos felinos-felizes nas noites quentes de algum bar; em manhãs ensolaradas à beira-mar de algum litoral; nas tardes preguiçosas que abraçados dormiremos em redes e camas e sofás...
Você disse que viria num sábado. Mas não quero ser feliz apenas aos sábados, com você quero dias úteis, feriados e fins de semana. Desde o sábado no qual disse que viria, tenho taquicardias, ou são suas asas, pássaro-hippie, anunciando sua chegada, pousando concomitantemente com a esperança no meu coração?
(by, franck)
(imagem: internet)

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Quem é você quando ninguém está olhando?

Ele me disse que tinha quarenta anos. Que nos fins de semana, quando ninguém o via e ele se isolava no seu mundinho, ficava sem tirar a barba, por isso aquela barba de dois dias. Que andava sem roupas pela casa. Gostava de zapear canais de tevê, devorar livros de suspense, ouvir Tiê, Marcelo Camelo, Pato Fu. Que comia doces em excesso e pedia comida delivery. Que escrevia poemas, contos e cartas de amor, talvez para amores inexistentes. Dormia tarde. Acordava cedo. Que às vezes ficava bêbado de vodca. Fumava maconha. Tinha muitos pesadelos e poucos sonhos. 
Ele me disse que tinha quarenta anos, mas se passava por um cara de vinte. Me chamou para nos masturbarmos  pela webcam, numa sala de bate-papo, que ninguém nos veria e nem saberia quem éramos. 
(by, franck)     

terça-feira, 3 de julho de 2012

(Para ler ouvindo 'Cajuina', com Caetano Veloso)


P/Lêda, Chicão & Silvana

O dia chegou mansinho naquela sexta-feira de junho. A nossa euforia era visível quando nos encontramos no início da manhã, nas nossos rostos insônes e na perspectiva de nossa viagem ao litoral do Piauí. Dias antes tinha escrito sobre como a felicidade me visitou em três momentos diferentes, e, mais uma vez concluir que a felicidade podia ser um convite para viajar na companhia de amigos, na cumplicidade estabelecida, na simplicidade das pequenas coisas.
Simplicidade foi a pauta nos três dias que permanecemos juntos, porque fomos em busca dela voluntariamente, porque a sensação de liberdade fazia jus com aqueles momentos e o lugar. Como descrever o lugar? Ou melhor, os lugares que passamos, vimos, paramos, ficamos? Indescritível, seria o termo. Mas como não mencionar o verde do mar? A rusticidade da pousada que ficamos? As cidades bucólicas? As praias? O céu azul? A cidade histórica com suas ruas pacatas, praças arborizadas, barzinhos e lojas? As paisagens lunar nas noites de idas e voltas à pousada? Os risos frouxos? As conversas? As músicas de Ednardo como trilha sonora? As tardes preguiçosas?... Poderia enumerar tantos momentos, fatos, situações acontecidas em detalhes, mas tudo e todos são preciosos, por isso, me retenho ao aconchego de estar com amigos, a felicidade da simplicidade, os momentos únicos; que fantasiamos querermos sempre uma vista daquele mar, uma pousada para chamar de nossa, como sempre dissemos querer uma casa no campo e com ela os amigos, discos, filhos e muito mais...
Nem tínhamos voltado e já decidíamos viajarmos outra vez, em janeiro, de carro, até o Ceará, para novamente buscarmos os sabores, cores e cheiros de outros dias, outro mês. Buscarmos a felicidade, porque ela existe, como agora, neste fim de tarde de sábado, uma semana após aquele encontro, ou reencontro, não sei. Só sei que a felicidade me visitou mais uma vez, ela chegou nostálgica dessa vez, é verdade, numa canção de Ednardo, na cajuína que foi presente nesta viagem e a qual bebo aos pequenos goles.
Quando Ednardo silenciou, quando tomei toda a cajuína, coloquei Caetano Veloso no aparelho de som a me perguntar: 'existirmos, a que será que se destina'? Penso que talvez para saber que a cajuína seja cristalina, para que a matéria viva, tão fina, não turve nossas felicidades nordestinas.

(by, franck)
(imagem: franck)

sábado, 9 de junho de 2012

Doce e Salgado

Você me conta do frio da sua cidade. Para amenizar o calor que faz nesta cidade mais ao norte, sento-me num bar e peço algo gelado, com sabor de limão e hortelã; ao meu lado uma moça negra, sozinha também, muita maquiada, tomando refrigerante diet. Mais tarde, nesta noite, enquanto dirijo de volta para casa, nas ruas completamente vazias, ligo o rádio do carro e toca uma canção da Adriana Calcanhoto: 'eu ando pelo mundo e meus amigos, cadê? minha alegria, meu cansaço? meu amor cadê você?' e penso na moça do bar em algum quarto dessa cidade, esperando um telefonema, como eu.
O outono nesta cidade é quente, não temos nenhuma estação definida, estamos próximos da Linha do Equador. Acordo cedo, com o sol, céu azul, uma brisa e o mar que nos refresca do calor dos trópicos. Decido ir ao mercado central, uma amiga me falou desse mercado e nunca estive nos mercados centrais e quero ver as pessoas tomando café da manhã, partirem o pão, escolherem as frutas, os legumes, as carnes, se relacionarem. Preciso aprender a ver a beleza da vida neste lugar. Um prazer solitário. Me encanto com as cores, os cheiros e o burburinho. Quero conversar com as pessoas como quis com a moça negra. Mas apenas olho, observo, rio, recito algum poema que sei. Sou doce e salgado neste sábado. Com um único toque me transformaria em fruta madura e cairia da árvore. Mas atravesso outono como se fosse verão. Imagino seu frio. Você agasalhado. Uma música brega toca no mercado e uma música brega sempre quebra o encanto.
Paro numa banca no caminho de casa. Vejo meu livro exposto. Compro revistas. Cigarros. A rua está vazia e tudo está quieto, só se ouve o farfalhar dos jornais e das revistas. Olho a capa de uma revista, uma revista pornográfica, duas mulheres segurando chicotes. Tenho que chegar em casa, a moça da faxina me espera. Lembro de algo que li no qual dizia que 'o capitão voltou de suas viagens aos mares do sul. das Índias Ocidentais'... Me sinto assim, após ter estado no mercado central, mas você ainda não chegou para iniciarmos nossa viagem. Deixarmos as peças desse romance caírem livremente, colidirem e se acomodarem de alguma forma. Cada um de nós é um segredo para o outro.
O dia passa. O calor mais acentuado com o aparente deslocamento do sol. Recebo suas mensagens, um ritual estabelecido. Quero ir ao cinema. Quero receber uma amiga para tomarmos vinho, mas vinho não combinaria com o calor desse sábado. Penso em como eu e você somos mais parecidos do que diferentes. Com você moraria aqui, São Paulo, Dakota do Sul, Sibéria, África. A noite é fresca, tem lua e estrelas, quero ir ver o mar, é uma noite simplesmente bonita demais para se ficar enfurnado entre quatro paredes, mas você deve estar entre cobertas, na sua cidade, e, apesar de estarmos no mesmo país como o clima e tempo são tão diversos. Há Brasis dentro de um Brasil. Imagino você com seus olhos claros, pedrinhas coloridas que vêm do mar, o mar que você não têm, entre cobertores. Neste momento as sensações do dia e outras mais antigas se espatifam como vidro, como gelo, por não tê-lo neste calor tropical, nesta Ilha, perto deste mar, nesta noite, entre cobertas da sua cama que poderia ser a nossa.
(by, franck)
(imagem: franck)

terça-feira, 5 de junho de 2012

A felicidade não tem endereço

Recebi a visita de uma tia que mora no Sudeste. Fomos a uma vila de pescadores comprar artesanatos, frutos do mar e olhar os barcos. No fim de tarde, choveu e uma neblina atípica para a cidade e um lindo arco-íris nos saudou na volta para casa. Paramos na auto-estrada, numa chácara, para apreciarmos o espetáculo da natureza e tomarmos chocolate quente, saborear bolos típicos e nossas presenças. Falamos do jantar que faríamos com os peixes e os camarões, frescos, recém-comprados, do vinho que nos esperava, do calor e do colorido que nos encantou das mantas, redes e roupas embrulhadas para presentes.
Recebi um telefonema de um amigo, no domingo, quase noite. Estava no aeroporto, minha tia ia partir, talvez retorne no próximo ano e teremos o mesmo ritual de passeios, compras e jantares. Como se com isso tivéssemos um acordo, um pacto silencioso. Mas o meu amigo convidava-me para irmos ao circo, convite incomum desse que curte baladas e outros leros. O ir ao circo me remeteu a infância, no interior, quando ia ao circo ou cinema com meu pai; quando voltávamos de mãos dados, calados, nas ruas quase desertas daquela cidade pequenina, daquelas noites, tudo pra mim tão mágico e encantador.
Recebi um convite para viajar. Uma semana viajando com amigos, de carro, até uma praia quase deserta no litoral do Piauí, Delta do Parnaíba. Quero essa aventura de sol, sal, brisa, areia; quero uma semana regada com papos e companhia e aconchego de amigos de décadas. Assim, sem lenço e sem documentos, mas a sensação da busca da felicidade... Essa mesma felicidade que recebi de três formas distintas nesta semana, sem receitas, sem menu. Ela, a felicidade, chegou com uma pessoa querida, com um circo e suas lembranças, com uma viagem de amigos.
Recebi a felicidade e ela não tem endereço, reside na casa das possibilidades, essa semana ela aportou por aqui.
(by, franck)
(imagem: internet)

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Uma vila, uma casa de praia, um verão...

Antes de você partir, naquele verão, havia muito tempo que não chovia na ilha, fazia muito calor e resolvemos ir a uma vila onde era mais ameno e o mar cintilava e um amigo nos emprestara uma casa na praia. Compramos comidas, bebidas, cigarros e velas e não tinha muito a fazer na vila: um cinema velho, uma igreja precisando de pintura, algumas lojinhas, gaivotas e um pier em ruínas, e, pescadores por toda a vila ou no mar com seus barcos coloridos. Pela manhã ou a tardezinha, abríamos garrafas de champanhe ou de vinho, andávamos pela praia e você fotografava a igreja-mas nunca vi você entrando nela-os pescadores voltando do mar, o pôr-do-sol, nós dois, os nativos... Fazíamos amor na sala ou no chão do quarto principal e fechávamos as janelas e acendíamos as velas e ficávamos assistindo as nossas sombras iluminadas, ouvindo músicas antigas, fumando, contando nossas vidas... Como se tivéssemos estado naquela casa, naquela vila, para sempre.
Antes de você partir, naquele verão, fomos aquela casa de praia. Era uma casa velha e desbotada, eu andava pela casa a noite, às vezes saia para o cais, sentava na areia úmida, fumava cigarros e fitava a vila iluminada e via sua silhueta na sala falando ao telefone, lendo, vendo televisão, e, quando eu voltava, você sugeria que fôssemos nadar ou sentávamos na pequena banheira e fazíamos amor. Uma manhã fomos além da praia, nas dunas, você preparou patê de cebolas e atum, levamos também ovos, frutas, vinho, biscoitos e chocolates que você trouxe de sua cidade, há uma fábrica lá. Nos embriagamos, corremos pela orla deserta e tentamos nadar na forte arrebentação; a água ficou fria, o mar bravio, o sol desceu e você sentou, na areia, sozinho, procurando navios no horizonte. Isso me perturbou.
Antes de você partir, naquele verão que fomos aquela casa de praia, quando acordei certa tarde, o clima ficou mais ameno ainda, aproximamo-nos do mar e o céu se tornou lilás, depois acinzentado e ficamos calados por algum tempo. Dois cães corriam pela praia vazia. Você disse que eu deveria consultar um astrólogo, que essas vibrações planetárias agiam sobre o corpo de maneira estranha. Concordei sem entender exatamente do que você se referia. Sentamos mais tarde naquele dia em uma janela da casa, tomando vinho, fechei os olhos e deixei o cabelo ser suavemente eriçado pelo vento. As vibrações.    
Bronzeados e felizes, naquela casa de praia, naquela vila, as chuvas recomeçaram naquele verão e tudo que começamos a fazer era ver televisão, tomar vinho e champanhe, e, você passava horas jogando tarô e mais e mais introspectivo. Uma noite me disse que deveríamos ter ido ao Ceará, Canoa Quebrada, então soube que era hora de partir daquela vila, que logo você partiria da minha vida...
(by, franck)
(imagem: franck)

sábado, 12 de maio de 2012

Você 

Você é uma explosão de girassois
numa manhã azul
o aroma inesperado do mar
a milhas de distância do litoral.
Você é mel, é canela
também agridoce
alecrim
especiarias do mundo todo
num mercado de uma ilha
na América do Sul.
Você é uma bola de gude verde
uma pequena concha
uma garrafa azul
de um vinho degustado numa noite em Pirenópolis.
Você é uma alma velha, de mil anos, séculos,
secreta
milênios atrás
de rendas brancas, rosas vermelhas,
revirando baús
bruxa.
Você é um pedra preciosa
bússola
um mapa desbotado
um navio ancorado num porto sem nome
numa cidade desconhecida
que percorreu tantos caminhos
para que pudéssemos nos encontrar.
(by, franck)

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Uma balada ao cair da tarde


Ficamos ali, naquela praça, no centro da cidade, numa tarde de abril. Ríamos. Mãos dadas, bobos. Talvez apaixonados. Vimos nossos dentes amarelados de fumo e café, dissemos que precisávamos irmos ao dentista, que precisávamos de roupas novas, você com sua camiseta desbotada e eu com meu moletom surrado.
Ficamos ali, naquela praça, olhando podarem as árvores, ipês? Não sabíamos, mas sabíamos a canção que tocou na loja da frente, cantarolamos juntos. Ríamos. Risos frouxos. Largos. Olhos nos olhos. A tarde caia, mas não olhávamos nossos relógios, mas ouvíamos o badalar do sino da igreja na outra rua.
Ficamos ali, naquela praça, mãos dadas e risos ecoando. Combinamos irmos ao teatro, 'tudo que eu queria te dizer', e, pensei que não precisaria ir ao teatro para dizer-te da minha alegria. Dos meus medos. Dos meus sonhos. A noite chegava e ficamos olhando os transeuntes, pombos, vendedores, a cidade aos poucos se iluminando e nossas mãos se tocando, nossos olhos nos buscando, nossas bocas se aproximando.
Ficamos ali, naquela praça, no centro da cidade, na quase noite acontecendo. Me convidaste para irmos a Paris em junho, disseste que Paris é uma festa, lembrei de um conto do Caio, de Lyon, vinho, inverno europeu. O convidei para irmos à Buenos Aires em junho, comemorar aniversário de um amigo, talvez esquiar em Bariloche, dançar um tango. Você me disse que preferia Piaf, ponte
Neuf, brioche, Juliette Binoche. Divagamos. Rimos. Rimos. Rimos...
Começou a chover na tarde-noite de abril, na praça, na cidade, e, continuamos ali, encharcado de chuva, da tarde juntos, da nossa quase paixão. Bobos, mãos dadas, risos se confundindo, vimos balões no céu chuvoso e nem era junho, nem estávamos em Buenos Aires, ou Paris.
(by, franck)
(imagem: internet)

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Réquiem para um cravo

Cravo em ré maior, no trapiche. Flauta, no piér. Violino.
Guitarra, na maré. No refúgio.
Não amarelou, o cravo, da ilha. Pensei em girassol, não era. Nem flor.
Nas noites, reggae. Rappa. Beethoven. As manhãs, sem sol e sal.
Cordas arrebentadas e mucho, o cravo, silenciou. Sonhando com neve, nas tardes quentes do hemisfério sul.
Dele, fiz oferenda.
Joguei-o ao mar, numa madrugada. Rumo às Índias. Aos Pólos. Outras ilhas.
Cítara, ecoou.
(by, franck)
(imagem: internet)

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Uma carta para D...


Desculpe oferecer minha confusão a você, desculpe por não podermos estar juntos nesse feriado, desculpe pelo melodrama inevitável. Nunca serei capaz de escrever a carta que eu realmente queria escrever a você, esta carta não é a que estive escrevendo para você na minha cabeça nos últimos dias. Eu gostaria de fazer era um desenho para você.
Sinto saudades do que ainda não compartilhamos, parece uma combinação tão surreal de coisas, cafés da manhã, almoços, jantares, ligações telefônicas, mensagens pelo celular, caminhadas... Nossa espécie de mundo que ambos criamos. Sinto saudades, mas queria outras histórias, que o atendente da livraria olhasse para mim de forma diferente, que na fila da padaria alguém silenciosamente me entregasse um bilhete, que no escuro do cinema pegassem na minha mão, sei lá, comecei a inventar, a sonhar, a pensar situações assim, para afastar você dos meus pensamentos, mas o mais estranho é que esses pensamentos de minha imaginação seria você. Não consigo dizer o que quero, espero que você leia as entrelinhas. Tenho tido inveja das certezas dos outros, da segurança de vidas fixas. A vida é mais cruel que os sonhos. Porque o mundo exterior não acompanha meu estado interior? Porque os mesmos carros passam pelas mesmas ruas? As mesmas lojas vendem os mesmos produtos para as mesmas pessoas? Quando eu queira outro cenário, talvez o céu que você diz que agora é azul, a praia que você se encontra, queria ser pássaro alegrando o seu quintal.
Não sei se essa carta me trará alívio ou lembranças de nossos dias que ainda não vivemos. Só sei que o dromedário, que nunca fui, tornou-se mais leve à medida que ando pelo tempo livre, livrando-me de memórias, fotos, músicas, livros... Espalhando pelo deserto e deixando o vento enterrá-los na areia. Desculpe oferecer minha confusão a você, repito, talvez porque fins de tarde dominicais há muito me entristecem, lembra-me morte, negócios inacabados, culpa, perda, solidão... Desculpe meu melodrama, mas eu sinto saudades do castelo que construimos. Às vezes, as coisas mais reais só acontecem na imaginação. Lembrar do que nunca aconteceu.
(by, franck)
(imagem: franck)

sábado, 31 de março de 2012

Cartão Postal


Mande-me um cartão postal dos seus olhos castanhos. Da cor da roupa que está usando. Da tatuagem que tens no pescoço. Do seu novo corte de cabelo. Se puderes, mande-me neste postal trechos do livro que estás lendo. Cenas do último filme que viste. A paisagem da janela do seu quarto de dormir. O refrão da música que ultimamente é sua trilha sonora. O ringtone do seu celular. Mande-me também o sabor daquele seu drinque aos sábados. Seus sonhos de ontem à noite. Seus poemas inacabados. Da felicidade do seu cão quando chegas em casa. Se sobrar espaço, mande-me ainda, neste cartão, os cheiros de sua horta. Os gritos dos pregoeiros na sua rua ao amanhecer. Aquele beija-flor das tardes no jardim. Seu riso ecoando numa noite qualquer. As ondas do mar molhando seus pés descalços. As mangas bourbon comidas ao meio-dia no quintal. Seu ar blasé fumando cigarros mentolados. Mande-me, urgente, nessa quarta-feira chuvosa, imagens assim, para compor com elas um mosaico teu, um cartão postal, um quadro, uma fotografia... Não aguento mais 'essa ausência sua que atormenta', talvez assim, talvez, a aliviaria...
(by, franck)
(imagem: internet)

sábado, 24 de março de 2012

Não me pergunte como...


Não me pergunte como eu soube que você ia embora, essas coisas se intui, se pressente, mas talvez soube quando olhei seus olhos castanhos tão mais tristes ainda. Quando vi a mala vermelha sobre a cama. Não sei. Só sei que soube que ias embora. Talvez porque você ouvia 'rock and roll lullaby' na voz de Fernanda Takay, sua cantora preferida. Talvez por chegar e cheiros de incenso, maconha, malbec, café, odores incomuns para uma tarde, impregnavam a casa. Não me pergunte como soube que ias embora, mas aquele dia você vestiu azul, minha cor predileta. Me beijou demorado como tempos não fazia, quando cheguei. E quando cheguei, soube que ia embora, porque vi seu violão no sofá e não mais largado pelos cantos. Você estava lendo 'A sombra das vossas asas', de Fernanda Young, o que também estava lendo. Não me pergunte como eu soube que você ia embora, você foi, naquela tarde, quando o cão não fez festa quando cheguei, porque começou a chover e a previsão era de sol, quando um táxi chamou na rua. Essas coisas se pressente. As partidas são necessárias e inevitáveis. E eu soube. Apenas soube que você ia embora naquela
tarde. Como sei agora com sua ausência.

(by, franck)
(imagem: internet)

domingo, 18 de março de 2012

Amarelou


Minha paixão azul
amarelou.
Nesse jogo de esconde-esconde
onde todos os gatos são pardos.
(by, franck )
(imagem: internet)

terça-feira, 13 de março de 2012

Entardecer


No entardecer tropical
ouvindo Calcanhoto e tomando suco de uva
enquanto as cigarras entoam suas canções
e o sol adentra a casa passeando com seus raios na pele da pele das nossas peles
o lilás se esvai e um diurno oriente encontro em seu olhar
e no meu corpo ocidental habita sexo, sol, sal, saliva e
nossos odores...
A noite se anuncia escura e as cerejeiras em flor que me falas
brotam em algum amanhecer que não verei
no jardim, às vitórias-régias, aquáticas plantas,
fosforecem sob a fumaça dos nossos cigarros mentolados.
(by, franck)
(imagem: internet)

quarta-feira, 7 de março de 2012

Possibilidades...


As possibilidades se perderam quando ele se foi. Não lembro exatamente quando e nem porque, mas lembro do vazio das tardes com a ausência dele, das noites sem ele na minha cama, dos inúmeros telefonemas que cessaram... As possibilidades que se perderam tentei reencontrar em outros corpos, outras paixões, outros amores, outras aventuras, mas não passaram de tentativas e outras nuances possíveis num jogo de sedução, emoções, projetos e probabilidades em algumas noites, esquinas, risos, bares...
Quando as tardes voltaram a serem preenchidas, as noites acostumadas sem ele ao meu lado e sem esperar o telefone tocar sem ser o número dele chamando, ele voltou no carnaval. Veio sem máscara aparente, mas com uma marchinha que entoamos em outros carnavais. Num voo rasante, pássaro na fantasia e pela minha casa, pousou outra vez suas asas e seu corpo no tapete, sofá, cama e em meus braços. Vasculhou memórias, gavetas, jardim e o tempo que não nos víamos. A tevê desligada da folia momesca e como trilha sonora desse reencontro as chuvas sobre a cidade, blues, gargalhadas, e, seu violão dedilhado como em outro tempo, de possibilidades.
O carnaval passou e o pássaro decaido e infernal vagueia pela casa e não sei se ainda quero voar com ele e suas possibilidades abstratas e/ou concretas. Não sei se quero retomar aquelas tardes, aquelas noites, aqueles telefonemas, aquelas trilhas sonoras, aos sonhos que a quarta-feira de cinzas ainda não levou. O pássaro relaxou as asas. Baixei a guarda. As possibilidades, todas elas, espreitam-me.
(by, franck)
(imagem: internet)

quinta-feira, 1 de março de 2012

Quando o azul dos dias não desbotava


O domingo azul aos poucos desbotou quando soube que você partiu. Não sei quais os rituais para homenagear alguém que se vai, muito menos quando esse alguém é tão próximo, mesmo que tenhamos nos perdido no tempo e ficado apenas nas memórias.
As memórias são muitas. Lembro de sua casa amarela perto da estação de trem. Dos amendoins que trazia quando nos visitava. Você se despedindo de mim num fim de tarde na escola e eu chorando. De suas roupas escuras... Memórias que vieram aos borbotões, nenhuma que tivesse um começo, meio e fim. Desculpe tia Maria, mas o tempo, a distância, as lembranças registradas sobre você, sobre nós, são como um véu ou uma neblina na minha mente, fragmentadas; mas a dor da perda é intensa e verdadeira, porque queria ter voltado para ouvi Angela Maria com você, outras vezes, naquelas noites que os apitos de trens e a algazarra dos primos sobressaia à música; escutar sua risada nas tardes que o azul ainda não desbotava quando você costurava com minha mãe; saborear o doce de amendoim que você se orgulhava de fazer... Não voltei, não telefonei, não mais a vi, tia, desde que troquei aquela cidade de trens e amendoins por outras.
Desliguei o telefone com aquela voz familiar, também distante, de outra tia, anunciando sua perda, ainda presa aos meus ouvidos. Fiquei na varanda da casa buscando nossas lembranças e vieram essas, e, depois de um longo tempo, então, na manhã quase tarde desbotada, Angela Maria cantarolou pela casa e ao longe ouvi risadas sua. Apitos de trem. Crianças gritando. Tardes azuis. Cheiro de doce. E... Chorei!
(by, franck)
(imagem: internet)

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Se eu tivesse escrito nosso roteiro...


Se eu tivesse escrito nosso roteiro, não teríamos nos perdido ainda, na minha história estaríamos em alguma praia ao cair da tarde, em alguma vila olhando estrelas, numa madrugada ouvindo blues e tomando vinho, numa manhã acordando abraçados. No meu enredo os planos, os desejos, os sonhos, se concretizariam, e, você seria também um dos personagens principais. Claro, teria cenas em preto e branco, em sépia, mas o colorido invadiria os ângulos, closes, falas, marcações.
Se eu tivesse escrito nosso roteiro, não teríamos tido 'the end', mas uma história que seria uma novela mexicana, um filme francês, um seriado norte-americano, uma série brasileira todo dia, toda semana, todo mês. Não haveria vilão, mocinho ou herói, mas personagens reais como fomos, como somos. Como não escrevi nosso enredo e não li a sinopse, talvez por isso tenhamos sido canastrões, um fracasso de público, mas sucesso entre os amigos, com nossa adaptação de um romance B, sem estréia, muita luz e pouca ação.
Se eu tivesse escrito nosso roteiro, as cortinas não estariam fechadas, teríamos um 'grand finale', estariam pedindo bis.

(by, franck - imagem: internet)

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Um pequeno reino histórico e verde...




(Para Camila Aranha)


Precisava de uma viagem como quem precisa ir urgente a um banheiro. Ela aconteceu, rumo a Pirenópolis, em Góias. Viajar e sentir uma mudança excruciante nas placas tectônicas do meu cérebro, foi o que pensei.

A cidade ali: com seu casario de portas e janelas, seus lampiões, os casais nas suas ruas estreitas, as velas bruxeleantes sobre as mesas dos bares e restaurantes, as risadas, os vendedores, as lojinhas coloridas de artesanatos, a praça com sua feira... Independentemente da minha presença. Das nossas presenças. As montanhas em volta da cidade. A neblina pela manhã. As cachoeiras. As fazendas. Os passeios a pé. Um museu. Um vinho. Os sabores. O luar. Redescubro o meio rural e me pergunto como seria viver em Pirenópolis com sua sedução da alvorada e crepúsculos. Viver num pequeno reino histórico e verde... Eu que tenho uma preferência por bicicletas, a fantasia por tomates que fossem plantados no quintal dos fundos ou na frente da casa, amigos que aparecesessem para visitar sem avisar e que poderiam ficar quanto tempo quisessem... Como tenho a fantasia também de uma vida dramática!

Mas deu-se o que se chama de 'melancólia do viajante', o fato de que a maioria daqueles que amamos não faz a menor ideia de onde estamos, de que nossa ausência entre eles não é notada. E fica as perguntas: Quem somos e onde estamos quando não somos ninguém? O que é gratificante? O que nos esgota? O que somos lá? O que dá cá? O que nos inunda de felicidade? Viajar pode ser prazeroso e perigoso, como viver, como avisou Guimarães Rosa. Só sei que um punhado de momentos nos acompanharão a vida inteira.

E, aqui, nesta outra cidade, vejo nesta noite de domingo riscarem o céu, cinco, seis, sete estrelas, estendo a mão para pegar uma, e, mandar para Camila Aranha no Rio de Janeiro ou em Belém?



(by, franck - imagem: franck)








(Quem dá a volta ao zodíaco comigo...)

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Um brasileiro-nordestino, um cara comum, qlq um, como diria Caetano Veloso...