segunda-feira, 14 de maio de 2012

Uma vila, uma casa de praia, um verão...

Antes de você partir, naquele verão, havia muito tempo que não chovia na ilha, fazia muito calor e resolvemos ir a uma vila onde era mais ameno e o mar cintilava e um amigo nos emprestara uma casa na praia. Compramos comidas, bebidas, cigarros e velas e não tinha muito a fazer na vila: um cinema velho, uma igreja precisando de pintura, algumas lojinhas, gaivotas e um pier em ruínas, e, pescadores por toda a vila ou no mar com seus barcos coloridos. Pela manhã ou a tardezinha, abríamos garrafas de champanhe ou de vinho, andávamos pela praia e você fotografava a igreja-mas nunca vi você entrando nela-os pescadores voltando do mar, o pôr-do-sol, nós dois, os nativos... Fazíamos amor na sala ou no chão do quarto principal e fechávamos as janelas e acendíamos as velas e ficávamos assistindo as nossas sombras iluminadas, ouvindo músicas antigas, fumando, contando nossas vidas... Como se tivéssemos estado naquela casa, naquela vila, para sempre.
Antes de você partir, naquele verão, fomos aquela casa de praia. Era uma casa velha e desbotada, eu andava pela casa a noite, às vezes saia para o cais, sentava na areia úmida, fumava cigarros e fitava a vila iluminada e via sua silhueta na sala falando ao telefone, lendo, vendo televisão, e, quando eu voltava, você sugeria que fôssemos nadar ou sentávamos na pequena banheira e fazíamos amor. Uma manhã fomos além da praia, nas dunas, você preparou patê de cebolas e atum, levamos também ovos, frutas, vinho, biscoitos e chocolates que você trouxe de sua cidade, há uma fábrica lá. Nos embriagamos, corremos pela orla deserta e tentamos nadar na forte arrebentação; a água ficou fria, o mar bravio, o sol desceu e você sentou, na areia, sozinho, procurando navios no horizonte. Isso me perturbou.
Antes de você partir, naquele verão que fomos aquela casa de praia, quando acordei certa tarde, o clima ficou mais ameno ainda, aproximamo-nos do mar e o céu se tornou lilás, depois acinzentado e ficamos calados por algum tempo. Dois cães corriam pela praia vazia. Você disse que eu deveria consultar um astrólogo, que essas vibrações planetárias agiam sobre o corpo de maneira estranha. Concordei sem entender exatamente do que você se referia. Sentamos mais tarde naquele dia em uma janela da casa, tomando vinho, fechei os olhos e deixei o cabelo ser suavemente eriçado pelo vento. As vibrações.    
Bronzeados e felizes, naquela casa de praia, naquela vila, as chuvas recomeçaram naquele verão e tudo que começamos a fazer era ver televisão, tomar vinho e champanhe, e, você passava horas jogando tarô e mais e mais introspectivo. Uma noite me disse que deveríamos ter ido ao Ceará, Canoa Quebrada, então soube que era hora de partir daquela vila, que logo você partiria da minha vida...
(by, franck)
(imagem: franck)

7 comentários:

  1. A partida do outro nos doe tanto e ao mesmo tempo leva uma parte da gente.

    Um bj

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  2. As vezes um momento assim dura pouco demais, mas, a essência fica para sempre.

    É triste ver alguém partir e restar apenas os momentos.

    Um abraço, gostei do teu blog.
    http://luzia-medeiros.blogspot.com.br/

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  3. Oi Franck!
    Admiro essa transparencia... E a beleza que vibra nos ricos detalhes.

    saudade daqui
    =)

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  4. Problema da partida é, justamente, ter chegado.
    Criamos portos imaginários.
    Frios.

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  5. Um dia, ainda vou descobrir por que partimos e por que há sempre quem parta... talvez o tarô explique, talvez a numerologia, deve ser que o tempo do encontro simplesmente se esgotou.

    Suzana Guimarães - Lily

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  6. Chegadas e partidas, uma canção eterna para peles e espíritos.
    Bj, meu queridão

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  7. Hum...delícia de momentos, hein? Pena que nada é para sempre...


    Abraço Franck!

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