..."ele abriu a boca, mas antes de repetir as mesmas coisas ouviu o clique do fone sendo colocado no gancho do outro lado da cidade"...
(Caio Fernando Abreu-'Pela passagem de uma grande dor')
Madrugada de sábado. A tevê ligada sem som, só o lusco-fosco da tela azulada, um filme antigo, uma cena num aeroporto, olho um pouco e volto a me concentrar numa leitura vã. Lá fora buzinas de sirenes, motores de carros e motocicletas, pios de pássaros. O telefone toca. Me assusto ao primeiro toque, penso não atender, mas atendo-o ao sexto toque.
-Alô!
-Oi, Miguel, acordado? Acordei você?
-Não, Marina, algum problema? Aconteceu alguma coisa?
-Não... Sem sono... Como sei que você também tem insônia... Estava fazendo o quê?
-Lendo, ou tentando... É a biografia de Jack Kerouac... Meio chatinha. E você?
-Hum... Hum... Estava vendo um filme antigo, preto e branco. Casablanca. Terminou. Já tentei ler, escrever, ouvir música, tomar chá, leite morno com mel, e... não consigo dormir.
-Insônia é terrivel... Sabemos disso, Marina. Que horas são? Vamos sair para tomar algo? Ver o sol nascer na praia? Já está amanhecendo?
-Acho que sim, Miguel. É, está amanhecendo, abrir a janela, vejo uns raios vermelhos no céu, a cor da manhã chegando. Mas não quero sair. Vou tomar um banho quente. Telefonei para ouvir sua voz... Você viu os corpos caindo? Parecia chuva de vida!
-Corpos caindo? Quando? Onde? Que corpos, Marina?
Do outro lado da linha, silêncio. Espero um tempo crucial. Ouço ruídos. Chiados. Falhas na comunicação? Marina não responde meus alôs. Levanto-me, saio para a quase manhã, o vento frio enregela meu corpo, percebo que não me agasalhei. Ligo o carro e nas ruas vazias em direção a Marina, a sua casa, silenciosamente faço uma prece, eu que nem sei rezar, orar, fazer preces. Silenciosamente, peço para que não seja de Marina um dos corpos que se fez chuva, chuva de vida, nesse início de sábado.
(by, franck)
É, chuva... chuva de vida. E isso pode ser interpretado em dois sentidos, tanto metafórico quanto real.
ResponderExcluirMuito bom o seu texto.
Beijos pra ti e ótima sexta.
Boa noite Franck,
ResponderExcluirmuito bom o seu texto, é daqueles que lemos e não desejamos que o fim chegue tão depressa.
Se o corpo de Marina se fez chuva ou não, cabe a cada um de nós, seus leitores imaginar.
Gostei muito!
Beijinhos,
Ana Martins
Ave Sem Asas
Ela fez chuva de vida? Sei não. Capitu traiu o marido? Sei não.
ResponderExcluirOi menino
ResponderExcluirCheguei a imaginar coisas, ao final do texto. Isso me trouxe amargas lembranças.
Bjux
cara adorei isso *-*
ResponderExcluirA cada leitura que faço tua, você me surpreende ainda mais.
ResponderExcluirFiquei arrepiada, tamanha foi a emoção!
Beijo Franck
para, não é que tens todo um talento para o conto, é como, você criou toda uma atmosfera envolvente, algo noir, amei Frank, ^^
ResponderExcluireste texto foi impressionante, quis saber mais e mais dele, até uma hora que fiquei na vontade... rs
ResponderExcluirem off agora, sabe, estava eu pelo seu blog e eis que começo a alimentar seu "aquário" sem querer. qdo clickei em cima do peixinho eu pensei q o tinha matado e me dezesperei, dps vi q eram bolinhas de alimento. sabe o que percebi tb? se vc jogar vários alimentos em um canto e jogar uma vez no outro canto, eles não perceberam... enfim, viajei mto. pareci uma criança agora... rsrs
abç!!!
''Vamos sair para tomar algo? Ver o sol nascer na praia? Já está amanhecendo?''
ResponderExcluirToda vez que leio isso, me dá uma vontade fazer!
faço várias vezes, e sinto um alívio imenso.
Obrigado Franck!
vão existir, muito obrigado (:
ResponderExcluirBom fim de semana também para ti (:
Gostei da coragem de dizer não.
ResponderExcluirHa momentos que
um pouco de
fazer nossa vontade
é tudo.
Quanto ao que vai encontrar...
pois que seja
o que tiver que
ser.
Adoro voce escrevendo assim
di
ver
si
fi
ca
da
men
te.
Te adoro.
Sempre virei te ler e te ver
pq o mais importante ja acontece
:te sinto
entre meus sonhos e delírios
triste, ainda que lindo.
ResponderExcluirQueria poder evitar tragedias, sofrimentos, tristezas...continuo com as minhas mas cuido das dos outros.. sempre fui assim mas as vezes sou tao ineficaz :/
Estimado Franck, mais um texto de excelência, muito bem escrito e que nos prende, amarra à leitura integral... soube-me a pouco, tem continuidade? Adoro a maneira como escreves, e sinceramente tem muito jeito e talento.
ResponderExcluirTem um bom fim de semana.
Beijinho
Chuva de vida...eu quero SEMPREEEEEEEEEE!
ResponderExcluirbjossssssss
Que texto! meu coração acelerou no final.
ResponderExcluirEstou de casa nova e espero sua visita, você me encontra agora no Rasuras
BeijooO* te aguardo!
...você é fantástico!
ResponderExcluiradoro
bj
noooooossa !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
ResponderExcluir*-*
Deixou-nos a responsabilidade de saber se o corpo de Marina virou chuva ou não... Tragico como sou, dramático como sou, ela seria tempestade.
ResponderExcluirAbraços, meu amigo!
Hoje passo apenas para desejar um ótimo fim de semana. Saudações, Jacson.
ResponderExcluirLigação de madrugada pra mim é igual aquela antiga vinheta do Plantão da globo: Prenúncio de tragédia.
ResponderExcluirótimo texto...
abraço
Rafa Feck
Que gostoso...
ResponderExcluirQue bom inicio para um livro de suspense.
p.s: pobre biografia de Kerouac...rs
Abraços, querdio!!!
Insônia... solidão e morte...
ResponderExcluir